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Caatinga: o bioma da resiliência (1 notícias)

Publicado em 25 de junho de 2013

Por Sucena Shkrada Resk

O bioma da Caatinga revela surpresas que poderiam ser consideradas improváveis devido à adversidade imposta pela seca. Quem poderia imaginar que anfíbios conseguem ficar até um ano sob a terra esperando a próxima chuva? É exatamente isso que acontece com algumas espécies da Caatinga, segundo o biólogo Carlos Navas, do Departamento de Fisiologia da Universidade de São Paulo (USP). É esta característica se dá o nome de "estivar". "Na fase de depressão metabólica, alguns ficam de olhos fechados (como os ursos hibernando)", explica.

Navas esteve presente no Ciclo de Conferências 2013 sobre a Biota Caatinga, realizado no último dia 20, em São Paulo, pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), que reuniu outros pesquisadores que falaram sobre pesquisas e informações recentes do bioma. O biólogo destaca que os anfíbios possuem estratégias muito eficientes de armazenamento de energia; existem, ainda, espécies que conseguem fabricar um tipo de casulo na própria pele, onde retêm água. "Outros anfíbios desse bioma aumentam a capacidade de concentração do corpo para capturar o líquido do meio ambiente e até chegar ao nível do lençol freático". Estes animais desenvolveram adaptações morfológicas e fisiológicas para sobreviverem no bioma.

A perereca-de-capacete (Corythomantis greeningi) é uma dessas espécies resilientes, como descreve o biólogo Adrian Antonio Garda, do Laboratório de Anfíbios e Répteis do Centro de Biociências da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (CB/UFRN). "Ela é praticamente encontrada em todo bioma. Sua pele fica bem colada ao osso e serve de proteção, pois esses animais ficam geralmente em frestas de rochas. Há gêneros semelhantes que fazem seu abrigo em bromélias", esclarece Garda.

Na vegetação da Caatinga, as espécies campeãs de resistência nos longos períodos de estiagem são as suculentas, que têm capacidade de armazenamento de água. Segundo o biólogo Luciano Paganucci de Queiros, do Departamento de Ciências Biológicas da Universidade Estadual de Feira de Santana (DBBio/UEFS), elas têm mais condições de sobrevivência diante de um cenário de mudanças climáticas. "Foram feitas simulações em pesquisas em Edimburgo que constaram que, com as possíveis variações de dois a três graus na temperatura, essas espécies conseguiriam resistir ao aumento", conta. Essa capacidade faz com que, no meio científico, já surjam propostas de chamar a Caatinga de Bioma das Suculentas. "São conhecidas hoje 87 espécies de Cactáceas, sendo 83% delas endêmicas. Uma das grandes ameaças à conservação é que elas são retiradas do meio ambiente e vendidas como souvenires em beiras de estrada", explica Luciano.

Espécies endêmicas

Queiros explica que, atualmente, a vegetação da Caatinga possui cerca de seis mil espécies e 1.333 gêneros, sendo deles 18 endêmicos (que só ocorrem lá), de acordo com o especialista. Entre as descobertas endêmicas ocorridas neste ano está a planta carnívora de dunas (Philcoxia tuberosa).

Na lista da fauna, são 156 mamíferos (sendo 8% endêmicos), 510 aves (7% endêmicas), 119 répteis (37% de lagartos endêmicos), 56 anfíbios (12% endêmicos) e 240 peixes (57% endêmicos). "É uma amostrado parcial porque 40% do bioma ainda não foi inventariado", alerta Garda, da CB/UFRN. Mas há espécies que já se encontram sob forte pressão antrópica e correm risco de extinção. Entre elas, o tatu-bola (Tolypeutes tricinctus), a onça-parda (Puma oncolor) e o pássaro soldadinho-do-araripe (Antilophia bokermanni), como destaca a Associação Caatinga, organização socioambiental da região. A ararinha-azul (Cyanopsitta spixii), outro animal endêmico deste bioma, hoje só é encontrada em cativeiro.