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Butantan inaugura fábrica de vacina contra gripe (1 notícias)

Publicado em 27 de abril de 2007

Por Fábio de Castro, Agência FAPESP

Primeira instalação do tipo na América Latina deverá suprir a demanda de imunização gratuita para idosos. Produção será fornecida gratuitamente para o Ministério da Saúde, que gasta US$ 100 milhões por ano com a vacina

O Instituto Butantan inaugurou nesta quinta-feira (26/4), em SP, a primeira fábrica de vacinas contra o vírus influenza, causador da gripe, na América Latina. Com 10 mil metros quadrados ocupados por equipamentos de alta tecnologia, a planta terá capacidade anual de produção de até 40 milhões de doses de vacina.
O investimento de R$ 68 milhões foi feito pelo Ministério da Saúde e pelo governo paulista. Desde 1999, o Brasil comprava da França o concentrado necessário para a formulação da vacina, com custos anuais de cerca de US$ 100 milhões.
Na época, o Instituto Butantan e a Fundação Butantan fizeram um acordo de transferência de tecnologia com a empresa farmacêutica francesa Sanofi Pasteur, concluído agora.
Durante a inauguração, a Secretaria de Estado da Saúde de SP também anunciou a construção, até 2009, de duas novas fábricas: uma de hemoderivados e uma para a produção de uma vacina brasileira contra o rotavírus.
Ambas serão instaladas no Instituto Butantan e terão investimentos estimados em R$ 60 milhões.
De acordo com Isaias Raw, diretor do Instituto Butantan, a vacina contra a gripe produzida na nova fábrica será entregue ao Ministério da Saúde, que a redistribuirá aos estados gratuitamente. Cada estado arcará com os custos de inoculação.
"É o mesmo processo que ocorre com outras vacinas que produzimos e que correspondem a 82% das feitas no país. Com a nova fábrica, o Butantan suprirá completamente a demanda de vacinas usadas na campanha nacional dos idosos a partir de 2008", disse Raw à "Agência Fapesp".
Atualmente, as 20 milhões de doses utilizadas na imunização gratuita de maiores de 60 anos e outros grupos de risco são inicialmente produzidas na França. O Instituto Butantan faz a formulação dos três tipos diferentes de vírus, o envasamento e o controle de qualidade da vacina.
Segundo Raw, a nova fábrica representa um passo inédito para a indústria nacional, uma vez que grande parte dos equipamentos utilizados — como tanques, reatores e outros produtos específicos em diferentes etapas de produção — foram desenvolvidos com mão-de-obra local, gerando conhecimento, inovação e desenvolvimento tecnológico.
"Trata-se de um dos maiores empreendimentos que o Butantan já fez, pelo tamanho da fábrica e pela sua complexidade. É um salto importante, mas não é o único. A produção da vacina para a gripe aviária é fundamental porque, se houver uma pandemia, a vacina não estará disponível para os países em desenvolvimento", destacou.
Raw afirmou que o Brasil é pioneiro na produção pública de vacinas, com o Instituto Butantan e a Fundação Oswaldo Cruz. "A China não dá vacina de graça, a não ser para uma parcela mínima da população. Na Índia, o sistema é todo privado. O Brasil vacina todo mundo. Queremos entrar na competição internacional e pressionar para baixo o preço do produto."

Instalações high-tech
Com equipamentos de última geração — a maior parte fabricada no Brasil — o novo laboratório foi projetado para ser uma das poucas fábricas de biosegurança de nível 3, conforme certificação da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), a exemplo da futura unidade de vacinas contra a gripe aviária, de acordo com a diretora da Divisão de Produção do Instituto Butantan, Hisako Higashi.
Segundo Hisako, cada lote da vacina demora dois meses para ser produzido. "Mas o primeiro lote deverá ficar pronto dentro de oito meses, porque ainda haverá um processo de qualificação dos equipamentos e do ar-condicionado especial que faz a desinfecção do ar em todo o interior da fábrica", disse.
O processo de fabricação da vacina é feito com ovos de galinha, nos quais o vírus ativo é inoculado para a produção da vacina. A fábrica recebe 123 mil ovos por vez. "Cada ovo corresponde a uma dose. Eles passam por uma desinfecção e são incubados por 11 dias antes de entrarem na área de biossegurança", explicou Hisako.
Um equipamento inocula o vírus na câmara de ar interna dos ovos, que são enviados para outra incubadora na qual ficam de 30 a 96 horas. Os ovos seguem para uma câmara fria, cuja função é matar o embrião. Um equipamento separa o líquido alantóide em que está a vacina do embrião morto e cascas. Os dejetos são triturados e desinfectados.
"Depois, misturamos citrato ao líquido alentóide e centrifugamos para tirar as impurezas. Com isso, dos cerca de 1.350 litros restam apenas 150, que são fracionados e enviados para a ultracentrífuga, uma das duas existentes na América Latina — a outra também está no Butantan, na unidade de produção de vacina contra a hepatite B — em seguida, sobram 25 litros, que são diluídos e tratados com substâncias químicas para matar o vírus. Finalmente, passamos à formulação farmacêutica", explicou a cientista.

Próximas fábricas
Além da fábrica de vacina contra a gripe, o Instituto Butantan abrigará, a partir de 2009, uma unidade de hemoderivados e outra de vacinas contra o rotavírus. Tem ainda uma fábrica piloto pronta para a produção da vacina contra a gripe aviária.
A fábrica de hemoderivados produzirá imunobiológicos a partir do fracionamento do plasma de sangue humano, como imunoglobulinas e albuminas, além de fatores de coagulação. Hoje, esses procedimentos são realizados na Europa.
Segundo a Secretaria de Saúde de SP, a fábrica terá capacidade para processar 150 mil litros de plasma por ano. O Estado responde pela metade de todo o plasma sanguíneo coletado no Brasil.
A fábrica de vacinas contra o rotavírus deverá produzir 10 milhões de doses por ano, suprindo toda a demanda nacional. O excedente poderá ser exportado. A vacina contra o rotavírus — que causa diarréias graves principalmente em crianças — faz parte do calendário nacional de imunização desde 2006. O Ministério da Saúde gasta cerca de US$ 60 milhões por ano na importação do produto.
A fábrica piloto de vacina contra a gripe aviária aguarda a licença de manipulação do vírus pela CTNBio. O Butantan é um dos cinco centros produtores de vacina do mundo que compõem a força-tarefa da Organização Mundial da Saúde (OMS) para o combate a gripe aviária.
"Nosso objetivo é desenvolver uma vacina segura, eficaz e de baixo custo, que permita proteger o Brasil no caso de uma eventual pandemia", disse Isaias Raw.
Segundo o cientista, a vacina que está sendo produzida em países desenvolvidos custa cerca de US$ 30 por dose, o que tornaria inviável para países mais pobres. "O Butantan produzirá a vacina com um novo adjuvante que descobrimos e que poderá baixar os custos em até 10 vezes", afirmou.
(Agência Fapesp, 27/4)