Dois dos principais cientistas brasileiros, o físico Paulo Artaxo e o climatologista Carlos Nobre, destacaram os desafios das alterações do clima nesta quinta, 14, durante o primeiro dia do fórum Mudanças Climáticas Globais - Desafios e oportunidades de pesquisa, realizado na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Ambos integram o Painel Intergovernamental da ONU sobre Mudanças Climáticas (IPCC).
Artaxo, que é professor do Instituto de Física da Universidade de São Paulo e membro da coordenação do Programa Fapesp de Pesquisa sobre Mudanças Climáticas Globais (PFPMCG), apresentou os aspectos físicos presentes nessas mudanças. "Essa é uma área de pesquisa muito dinâmica, na qual a cada semana são publicados em torno de sete artigos científicos", explicou à Agência Fapesp.
Segundo o físico especializado em ciências do clima, além de acompanhar a produção na área, outro desafio é a complexidade dos dados envolvidos, uma vez que o quadro geral mundial com relação às mudanças climáticas é ainda pouco preciso e/ou formado por um mosaico de conhecimentos fragmentados, os quais, ainda que precisos, apresentam pouca conexão entre eles.
Mesmo com essas limitações, Artaxo estimou ser possível concluir que a ação humana tem causado sérios impactos sobre o planeta, a ponto de alguns pesquisadores proporem chamar a era contemporânea de Antropocênica, na qual a atividade dos seres humanos teria suplantado a da natureza na modificação do planeta. "Já ultrapassamos a capacidade de regeneração do planeta em três áreas: na razão da perda da biodiversidade, nas alterações do ciclo do nitrogênio e nas mudanças climáticas", alertou Paulo Artaxo.
De acordo com Artaxo, cada metro quadrado da superfície terrestre recebe em média 342 watts de energia em forma de radiação solar. Desse montante, estima-se que 1,66 watt fique no solo e contribua para tornar o planeta mais quente. Os dados foram calculados por meio do conceito da forçante radiativa, uma das contribuições da física ao problema do aquecimento global.
Impacto das Mudanças Climáticas na Amazônia
Na mesma mesa onde foi realizada a apresentação de Artaxo, Carlos Nobre, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e coordenador executivo do Programa Fapesp de Pesquisa sobre Mudanças Climáticas Globais (PFPMCG), comentou o impacto das mudanças climáticas na Amazônia.
A contribuição do Brasil em relação as mudanças climáticas se dá, principalmente, nas emissões de dióxido de carbono (CO2) por queimadas na região amazônica, que contribuem com 56% dos gases-estufa emitidos no país. Elas são seguidas pela atividade agropecuária (24% das emissões) e pelos meios de transporte e geração de energia (12%).
Segundo Nobre, o Brasil está em uma posição privilegiada por conseguir reduzir as emissões com a diminuição das queimadas. "A China, por exemplo, não conseguirá cortar as emissões sem afetar seu Produto Interno Bruto (PIB". O Brasil não sofreria esse mesmo efeito em sua economia¿, argumentou o climatologista.
Outra boa notícia é que as queimadas brasileiras têm diminuído nos últimos anos. Enquanto em 2004 o país emitiu cerca de 900 toneladas de CO2 na atmosfera em razão dessa prática, o total em 2008 caiu para 500 toneladas.
Nobre apresentou resultados de pesquisas que simulam a recuperação vegetal que seria feita caso a Floresta Amazônica fosse totalmente devastada. As simulações apontam o índice de 40% como limite de devastação para que a cobertura vegetal não sofra uma degradação irreversível. Nesse ponto, o Cerrado se misturaria à Floresta Amazônica, descaracterizando boa parte desse bioma, em processo chamado de savanização da floresta.
Outro limite importante para que a Amazônia seja preservada, de acordo com Nobre, está relacionado à temperatura global, que não poderia se elevar em mais do que 3ºC. Acima desse nível, a floresta estaria seriamente ameaçada, conforme indicam uma série de modelos climáticos.
Nobre ainda apontou a necessidade de se avançar em mais experimentos que envolvam florestas tropicais. "As informações de que dispomos sobre a influência do aumento de carbono na cobertura vegetal são de florestas temperadas", observou.
Em experimentos realizados no hemisfério Norte, descobriu-se que o aumento na concentração de carbono na atmosfera é capaz de elevar em até 25% a capacidade dos vegetais em fixar material orgânico, o que aceleraria o seu crescimento e poderia compensar a falta de outros recursos. "No entanto, não podemos dizer que isso também vale para a Floresta Amazônica, pois não temos estudos sobre o tema".
Para o cientista, apenas uma parte da preservação da floresta passa por questões de políticas públicas. "Podemos reduzir as queimadas, mas não temos controle sozinhos sobre o aumento da temperatura global. Se a temperatura aumentar em mais de 5º C, as florestas tropicais estarão em grande risco", projetou Carlos Nobre. O fórum Mudanças Climáticas Globais termina nesta sexta-feira (15).
Fonte: EcoDesenvolvimento