Pesquisadores brasileiros desenvolveram um aparelho portátil para diagnosticar anemia: o hemoglobinômetro. O projeto, fruto de uma parceria público-privada, poderá ajudar no combate à doença nutricional mais comum do mundo: a anemia causada por falta de ferro, conhecida como anemia ferropriva. Pelas estimativas da Organização Mundial da Saúde (OMS), a deficiência atinge 25% da população mundial e, nos países em desenvolvimento, 50% das crianças com idade inferior a quatro anos.
Basta uma picada no dedo para realizar o exame . Nos testes do aparelho, os pesquisadores contaram com a ajuda do médico Mário Maia Bracco, do Centro Assistencial Cruz de Malta, que atende a população carente na zona sul de São Paulo. Mais de cem crianças de 4 a 6 anos, no Jabaquara, foram avaliadas. O resultado, então, foi comparado com outros métodos de diagnóstico.
Além de validar o aparelho, os agentes de saúde descobriram uma alta prevalência de anemia: pouco mais de 20%. Com o apoio da prefeitura de Ilhabela, litoral norte paulista, e da pediatra Juliana Teixeira Costa, os pesquisadores também avaliaram 670 crianças na cidade. Cerca de 18% apresentavam anemia. As famílias receberam orientações para melhorar a dieta dos filhos. Após 45 e 90 dias, o exame foi feito novamente. Cerca de 95% das crianças saíram da faixa de anemia.
Adoção pelo SUS
A equipe recebeu um financiamento de R$ 178 mil para testar a viabilidade de incorporação do equipamento ao Sistema Único de Saúde (SUS). Com o dinheiro, realizaram-se exames em Santa Luzia do Itanhi, no Sergipe, e em comunidades ribeirinhas do Rio Amazonas. “Testamos o equipamento em diversos cenários”, afirma Jair Chagas, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), um dos responsáveis pela invenção do dispositivo.
O equipamento ainda depende de registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Segundo a agência, o processo está “aguardando análise” e não é possível fazer previsões de quando o registro será concedido. No mês passado, Chagas descobriu que já pode pedir a patente internacional, pois foi reconhecida a originalidade do método de medição.
Existe um aparelho similar chamado Hemocue, produzido por uma empresa sueca. Cada ampola com reagente para realização de um exame custa, em média, R$ 5,30. “Mesmo em pequena escala, conseguiríamos fazer no Brasil por R$ 1,50″, afirma Chagas.
O equipamento brasileiro custaria R$ 2 mil. O importado sai por volta de R$ 3 mil, 50% mais caro, portanto.
Desdobramento
De início, os inventores Chagas, Paulo Alberto Paes Gomes e Maurício Marques de Oliveira - que se conheceram na Universidade de Mogi das Cruzes - pretendiam construir um equipamento para determinar a concentração no sangue da enzima conversora de angiotensina, importante para o controle da hipertensão.
A ideia inicial foi ampliada para outros parâmetros: sódio, potássio, glicose e colesterol. Por fim, concentraram-se no protótipo para medição de hemoglobina. Já há um protótipo pronto para medir glicohemoglobina, importante para o controle de diabete.
Chagas aponta que, com o aparelho, seria possível realizar campanhas em grande escala contra anemia. “Uma mãe não precisaria ir três ou quatro vezes ao posto de saúde para conseguir o resultado do exame”, afirma o pesquisador. “Sairia na hora junto com a especificação do tratamento.”
A Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) contribuiu com R$ 520 mil, principalmente por meio do Programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (Pipe), que apoia projetos desenvolvidos por cientistas ligados a microempresas.