Vamberto Luiz de Castro, de 62 anos, já havia recebido dos médicos a notícia de que contava com menos de um ano de vida. Funcionário público aposentado, tinha um linfoma e seu corpo não respondeu bem à radioterapia, nem à quimioterapia, e sentia dores tão fortes que dependia de doses máximas de morfina diariamente.
O caso
Em 9 de setembro último, o mineiro de Belo Horizonte deu entrada no Hospital das Clínicas em Ribeirão. Além das dores, perdera peso e sentia dificuldades para andar: o tumor se espalhara para os ossos. Com esse quadro clínico desanimador, a equipe médica foi autorizada a tentar um tratamento que ainda não havia sido testado no Brasil. E eis que um milagre aconteceu.
"Essa primeira fase do tratamento foi milagrosa", declarou ao G1 o médico hematologista Dimas Tadeu Covas, professor da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da Universidade de São Paulo (USP), coordenador do Centro de Terapia Celular (CTC-Fapesp) e do Instituto Nacional de Células Tronco e Terapia Celular, apoiado pelo CNPq e pelo Ministério da Saúde. "Não tem mais manifestação da doença, ele era cheio de nódulos linfáticos pelo corpo. Sumiram todos. Ele tinha uma dor intratável, dependia de morfina todo dia. É uma história com final muito feliz."
Terapia pioneira
Na verdade, trata-se de uma terapia genética pioneira na América Latina, com as chamadas células CAR T, que, desde 2018, tem sido recebida com entusiasmo por equipes médicas em países ricos, embora seu custo represente um entrave para a aplicação em larga escala nos sistemas públicos de saúde. Estamos falando de um tratamento que, nos Estados Unidos, custa mais de 475 mil dólares.
Incluindo as despesas hospitalares, o montante pode chegar a 1 milhão de dólares, segundo Covas, mas o professor estima que as plataformas brasileiras podem baratear os custos em até 20 vezes.
“Nós desenvolvemos uma tecnologia toda nossa, toda nacional, dentro de um instituto público, dentro de um hospital público, apoiado pela USP, pela Fapesp, pelo CNPq [Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico] e pelo Ministério da Saúde. Portanto, (é) um tratamento que se destina aos nossos pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS)”, completa o professor.
Investimentos para a pesquisa, um acalorado debate
A notícia torna ainda mais acalorado o debate acerca da importância dos investimentos públicos, em um momento de anúncio de cortes e congelamentos, que afetam tanto a pesquisa científica quanto o Sistema Único de Saúde (SUS).
O hematologista Rodrigo Calado, também professor da FMRP-USP e membro do CTC, enfatizou a importância dos investimentos:
“Esse tratamento foi possível pelo investimento em pesquisa e formação de pessoas feito pela Fapesp e CNPQ ao longo dos anos e que agora se traduz em um tratamento melhor e mais eficaz em casos de linfomas refratários.”
Vamberto recebeu alta no sábado (12). Para Covas, há motivo para celebrar:
“Representa um grande avanço científico, porque é um tratamento muito recente, uma tecnologia protegida por segredos industriais. E, por outro lado, é um grande avanço em termos sociais. Vamos poder oferecer isso, daqui a algum tempo, para a nossa população”, comemorou o professor.