O Brasil está a poucos meses de atingir a maioridade na produção de hormônio do crescimento. O Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen) assinou convênio com a Hormogen Biotecnologia para produzir e comercializar o hGH (human Growth Hormone), cujo consumo no País depende basicamente de importações. De janeiro de 1996 a abril de 1999, foram importados US$ 41,5 milhões em remédios que contém o hormônio, também chamado de somatotrofina, sem contar nesse total os custos com frete.
Uma ampola do hGH, com quatro unidades internacionais (ui), custa entre US$ 50 e US$ 70 no Brasil. A substância ativa, a somatotrofina, é vendida sob nomes diferentes, dependendo do laboratório. Entre outros, há o Genotropin, da Pharmacia Upjohn; o Norditropin, da Novo Nordisk; o Saiven, da Serono; e o Humatrope, da Eli Lilly.
Entre as indicações autorizadas para uso do hormônio estão o nanismo, ou a deficiência hormonal, tanto genética quanto adquirida - através de tratamento radioterápico, por exemplo-, a insuficiência renal crônica em pacientes infantis, e a síndrome de Turner, doença genética que afeta o cromossoma X.
O hormônio também pode ser usado na recuperação de pacientes com grave debilitação muscular, como é o caso dos aidéticos. Há outros usos mais prosaicos para o produto - e não aprovados pela comunidade científica ou autorizados pelo governo - como para aumentar a massa muscular de atletas.
Para o tratamento de deficiência de hormônio do crescimento, por exemplo, uma criança usa, em média, 0,1 ui por quilo de peso por dia, com seis aplicações semanais. Dependendo da gravidade do caso ou do início do tratamento, seu uso pode se prolongar por dez anos, diz Angela Spinola e Castro, professora-adjunta e chefe do Setor de Endocrinologia Pediátrica da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de São Paulo. Somente no seu departamento há, atualmente, setenta crianças em tratamento. Acredita-se que, na cidade de São Paulo, cerca de 600 crianças estejam utilizando o hormônio, isso sem computar os adultos, afirma a médica.
A Hormogen Biotecnologia foi formada especificamente para produzir a droga, inicialmente em escala piloto. A empresa tem sete cotistas, dos quais quatro são pesquisadores do Ipen. Os pesquisadores detêm 70% do capital da empresa, e o restante está nas mãos de profissionais, encarregados de administrar os negócios.
A Hormogen recebeu um financiamento de R$ 250 mil da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) para comprar equipamentos e material de consumo no exterior, material de consumo no país e contratar serviços. A empresa está dependendo da chegada dos equipamentos importados e da aprovação do produto pelo governo para dar início à produção em escala piloto.
A previsão, de acordo com Antônio Eduardo de Freitas Nicodemo, gerente administrativo contratado da empresa, é de que isso ocorra dentro de nove ou dez meses. "Se não acontecer nenhum imprevisto pesado", diz. Enquanto isso, estão sendo feitas adequações físicas, como colocação de forro, piso e cantos arredondados, no galpão onde a Hormogen está sendo instalada.
O galpão fica no Centro Incubador de Empresas Tecnológicas (Cietec), um espaço de dois mil metros quadrados, dentro do próprio Ipen, onde podem se instalar 15 empresas em início de carreira.
A idéia do Cietec é fornecer meios para que empresas emergentes, com propostas tecnológicas, possam se desenvolver ali por três anos. Toda a infra-estrutura do Cietec, como luz, telefone e aluguel, é bancada por quatro instituições públicas.
O Ipen vem pesquisando o hormônio do crescimento há cerca de vinte anos. Seu ingresso nessa área se deu por que, na época, a detecção dos hormônios era feita com Iodo-125, material radioativo. Desde então, mudaram as técnicas, mas o instituto já tinha interesse e "know-how" na área e continuou a atuar no segmento.
"Chegamos a fornecer para a Central de Medicamentos do Ministério da Saúde, durante dois anos, hormônios extraídos da hipófise de cadáveres humanos", informou Paolo Bartolini, chefe do Departamento de Biotecnologia do Ipen e "pai" do projeto.
Devido a problemas de contaminação, entre outros, a técnica foi abandonada. Atualmente, o hormônio do crescimento é sintetizado a partir da recombinação genética de bactérias.
O Ipen definiu a tecnologia de produção do hormônio há cerca de cinco anos, e já domina não somente sua obtenção, como o método de purificação e o controle de toxicologia, das bactérias resultantes do processo. "O produto tem as características adequadas para ser distribuído no mercado", diz Cláudio Rodrigues, superintendente da instituição.
Quando as máquinas estiverem produzindo, a próxima tarefa dos cotistas da Hormogen será encontrar um parceiro que entenda do mercado, que tenha uma estrutura de marketing formada e canais de distribuição abertos, para viabilizar a produção e venda do hormônio brasileiro em escala comercial.
Há informações de que o laboratório Biobrás também estaria interessado em produzir o hormônio do crescimento, mas os executivos da empresa não estavam disponíveis para confirmar a notícia.
Notícia
Gazeta Mercantil