País deve investir US$ 120 milhões, de um total de US$ 60 bilhões, para ter direito de utilizar o laboratório espacial. Experiência da USP, realizada na gravidade zero, pode permitir a elaboração de medicamentos contra a doença de Chagas. Até o ano 2000, serão lançados 10 satélites que vão monitorar florestas e queimadas.
Quarenta anos depois de os russos terem lançado o primeiro satélite espacial -o Sputnik-1, a Agência Espacial Brasileira (AEB) se prepara para participar da construção do maior laboratório especial já construído, a Estação Espacial Internacional, que começa a ser montado a partir de 1998. A estação é um projeto de uma nave espacial tripulada, orçada em US$ 60 bilhões e do qual participam os Estados Unidos, Rússia, Canadá, Japão e Agência Espacial Européia, que envolve mais 14 países.
AAEB aprovou, recentemente, em conjunto com a Nasa - a agência espacial norte-americana -, o projeto do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que prevê a participação brasileira no projeto, orçada em US$ 120 milhões. Em troca, o País terá direito de utilizar um espaço (locker) na estação, por um prazo de dez anos.
O acordo com a Nasa, que coordena a execução do projeto, também contempla a oportunidade de o Brasil instalar equipamentos na estrutura externa da Estação (um satélite, por exemplo) e de levar e retornar equipamentos para o espaço, operação que será custeada pela agência norte-americana.
O País, segundo o diretor geral do Inpe, Márcio Nogueira Barbosa, terá a possibilidade inédita de utilizar uma janela de observação da estação toda vez que ela passar pelo Brasil. "Desta forma poderemos imagear diversas regiões do território brasileiro, utilizando várias câmeras e sensores disponíveis' na estação", comentou. A tripulação da Estação Espacial Internacional também poderá contar com um astronauta brasileiro em uma de suas missões, segundo o acordo estabelecido com os coordenadores do projeto.
O Inpe vai gerenciar a fabricação dos equipamentos brasileiros, sob a responsabilidade da indústria nacional que segundo o diretor Márcio Barbosa, está capacitada para desenvolver 80% do projeto. De acordo com Barbosa, será permitida a formação de consórcios e a participação de empresas estrangeiras. A fonte de recursos que será aplicada pêlo Brasil no projeto ainda não está definida mas, segundo ò diretor do Inpe, uma parte deverá ser financiada pelo Tesouro Nacional e a outra virá de um financiamento externo.
A idéia dos coordenadores do projeto no Brasil era a de garantir, a disponibilidade dos recursos até a vinda do presidente Bill Clinton ao País, ainda este mês. "Precisamos desse compromisso de liberação dos recursos para podermos ter um ritmo de contratos com a indústria que respeite os cronogramas de trabalho dos outros países", disse. Os recursos/segundo Barbosa, devem ser repassados pelo Ministério da Ciência e Tecnologia em quatro parcelas, que serão distribuídas ao longo dos próximos cinco anos.
Entre os equipamentos previstos para serem fornecidos pelo Brasil para o projeto estão uma estrutura para acomodação de experimentos científicos na área externa da estação, uma "janela" para observações da Terra - por meio de câmeras - e uma plataforma utilizada pelo Ônibus Espacial, para transportar cargas para a estação. A indústria brasileira também será chamada para desenvolver um equipamento de suporte, que permitirá o manuseio, em órbita, das cargas, durante as operações de montagem e manutenção da estação.
A Estação Espacial Internacional vai apoiar pesquisas científicas e técnicas, permitindo que os cientistas acelerem o andamento de descobertas e invenções para aplicação prática nas áreas de saúde, medicina e tecnologia. As pesquisas serão feitas por uma tripulação multinacional de astronautas, cosmonautas e pesquisadores científicos. Este grupo vai morar e trabalhar na estação por um período máximo de seis meses.
A estação permanecerá no espaço por quinze anos. Uma vez completa, pesará mais de 470 toneladas e estará situada a 350 quilômetros da Terra. A sua órbita estará inclinada a 51,6 graus da linha Equatorial, permitindo uma cobertura diária de 85% da superfície da Terra. A atmosfera dentro da estação estará pressurizada ao nível de pressão do mar (1,2 mil metros cúbicos, o equivalente a dois aviões Jumbo), um ambiente considerado confortável para a tripulação viver.
Dessa posição vantajosa, segundo a Nasa, os cientistas serão capazes de conduzir pesquisas de longa duração sobre o ambiente do nosso planeta, os seus recursos naturais e também sobre as condições oceânicas e atmosféricas da Terra. "No ano 2000, a estação espera apoiar o trabalho de mais de mil cientistas localizados em universidades e laboratórios no mundo inteiro", informou a Nasa.
USP CONTINUA EXPERIÊNCIA FEITA NA NAVE AMERICANA
Fátima Laranjeira - de São Paulo
Depois de terem conseguido realizar a primeira experiência científica do Brasil ao espaço, os técnicos do Laboratório de Cristalografia de Proteínas do Instituto de Física da USP de São Carlos continuam trabalhando arduamente para dar continuidade ao experimento que teve uma de suas fases mais difíceis realizada a bordo dos ônibus espaciais norte-americanos Columbia e Atlantis em maio e julho deste ano.
A experiência de biotecnologia visava cristalizar moléculas de três proteínas: uma ligada ao desenvolvimento da doença de Chagas, outra sintetizada a partir da semente de jaca para combater infecções e uma terceira, originada do feijão camaratu (Cratylia mollis), estudada no tratamento de tumores cancerígenos.
A cristalização é uma fase de extenso processo multidisciplinar que visa obter medicamentos feitos a partir da tecnologia de planejamento de novos fármacos baseada em estruturas de proteínas-alvo. Ou seja, os cientistas descobrem um composto que tem uma propriedade importante para tratar determinada doença e tentam através do estudo de sua molécula - desenvolver um medicamento.
Como o melhor resultado da cristalização ocorre na ausência de gravidade, o coordenador do Laboratório de Cristaligrafia de Proteínas, Glaucius Oliva, num trabalho conjunto com a Brazilian Comercial Space Services (Brazsat) e com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, conseguiu firmar o acordo para desenvolver seu experimento com o Center for Macromolecular Crystallography da Universidade do Alabama, em Birmingham (EUA) - o braço da Nasa no setor biotecnológico.
Os cristais obtidos a bordo dos ônibus espaciais com os experimentos realizados com a enzina do Trypanosoma cruzi - o causador da doença de Chagas - e com a lectina do feijão camaratu foram considerados muito bons pela equipe comandada pelo professor Oliva. No entanto, a proteína da jaca, chamada Lectina km+, não obteve o resultado esperado: "Ela não estava tão purificada quanto precisávamos, e agora tentaremos retrabalhá-la".
"Nosso objetivo com a cristalização foi reconhecer a estrutura e a partir disso nossa equipe está tentando entender sua estrutura tridimensional", diz Oliva. A determinação da estrutura dos cristais se dá através de um processo chamado de difração de Raio-X e técnicas físicas sofisticadas que estão sendo desenvolvidas agora por uma equipe multidisciplinar. O trabalho está sendo feito no Laboratório de Cristalografia da USP de São Carlos e também no Laboratório Nacional de Luz Sincroton, em Campinas, onde existe um acelerador de elétrons que emite radiação capaz de caracterizar melhor os cristais obtidos no espaço.
Até o final do ano, Oliva espera ter as imagens tridimensionais das enzinas cristalizadas. "Aí começa o trabalho de química a ser passado a cientistas colaboradores para tentar chegar a uma droga que seja eficaz aos fins que queremos", explica.
No caso do Trypanosoma cruzi o objetivo é atacar uma das fontes de energia do parasita da doença de Chagas, que atinge cerca de 20 milhões de pessoas no mundo, a maior parte delas na América do Sul e Central. Já a lectina do feijão camaratu tem propriedades - identificadas pela Universidade Federal de Pernambuco - que poderão ser importantes no tratamento e diagnóstico de células cancerígenas.
Os primeiros testes serão feitos "in vitro" já em meados de 1998. "Devemos então ter uma boa família de compostos planejados, usando a tecnologia mais inovadora em todo o mundo da indústria farmacêutica", diz o professor, que já se prepara para, no próximo ano, embarcar suas experiências novamente em outra missão do ônibus espacial.
PAÍS DEVE LANÇAR 10 NOVOS SATÉLITES ATÉ O ANO 2000
Até o final do século, o Brasil estará ocupando uma posição inédita no cenário espacial internacional com a operação de 10 novos satélites em órbita, realizando missões de coleta de dados ambientais, monitoramento de florestas e queimadas, estudo da química a atmosfera, do volume de chuvas e transbordamento de rios.
Depois do sucesso do lançamento do SCD-1, o primeiro satélite brasileiro a entrar em órbita, o País concentra agora as suas expectativas em relação a dois grandes eventos: o lançamento, até o final de outubro, do segundo satélite da série SCD2a, por um foguete brasileiro, o VLS.
Passados quase 18 anos desde a criação da Missão Espacial Completa Brasileira (MECB), o País começa a viver uma fase de amadurecimento na área de tecnologia espacial. A indústria nacional, que até então tinha uma participação pequena nos projetos de desenvolvimento de satélites, passa a ocupar uma posição de destaque, com a perspectiva de assumir 80% dos trabalhos ainda sob a responsabilidade do Inpe.
Essa perspectiva deve tornar-se mais realista com a construção de uma plataforma multimissão, projeto que prevê a fabricação, pela indústria, de toda a estrutura e subsistemas dos três próximos satélites da MECB: o SCD-3 (Satélite de Coleta de Dados) e os satélites de sensoriamento remoto SSR-1 e SSR-2. Cada plataforma de satélite está orçada em US$ 30 milhões. Os consórcios liderados pela Avibrás e Tectelcom, de São José dos Campos, estão disputando a concorrência aberta pelo Inpe, para a fabricação da plataforma multimissão.
O consórcio liderado pela Avibrás, inclui outras duas empresas de São José, a Akros Engenharia e a Mectron, além da italiana Alenia e da argentina Invap. A Tectelcom participa da licitação com mais duas empresas, a Elebra, de São Paulo, e a Matra Marconi, da França. O valor do contrato não inclui a carga útil do satélite que, segundo o Inpe, também será colocada em processo de concorrência ainda este ano.
O satélite completo terá um custo de US$ 40 milhões. As propostas de participação na concorrência foram entregues pelas empresas no dia 19 de setembro passado. O consórcio vencedor da concorrência da plataforma terá um prazo de 30 meses, a partir da assinatura do contrato, para entregar o primeiro satélite, que tem lançamento previsto para o ano 2000. Antes disso, porém, o Inpe pretende colocar em órbita outros dois satélites, o SCD-2, da MECB, e o Satélite Sino-Brasileiro de Recursos Terrestres, o CBERS, desenvolvido em cooperação com a China. A previsão do diretor do Inpe, Márcio Nogueira Barbosa, é que os dois satélites sejam lançados ainda no primeiro semestre de 1998.
O SCD-2, que irá substituir o primeiro da série na missão de retransmissão de dados sobre o meio ambiente, coletados no solo e transmitidos ao satélite por meio de plataformas automáticas (PCDs), será lançado por um foguete estrangeiro, o Pégasus, da empresa americana Orbita Science Corporation. A empresa é a mesma que lançou o SCD-1 em fevereiro de 1993. O Inpe investiu US$ 10 milhões na construção do SCD-2 e vai gastar mais US$ 15 milhões no seu lançamento.
Junto com o satélite Brasil/China (CEBERS), o Brasil pretende colocar de carona no espaço um satélite científico - SACE — que vai abrigar pequenos experimentos que estão sendo desenvolvidos por pesquisadores do Inpe, de universidades e centros de pesquisa nacionais e internacionais. A seleção dos experimentos que serão levados à bordo do SACI foi feita a partir de um anúncio de oportunidade conduzido pela Academia Brasileira de Ciência.
O microssatélite levará quatro experimentos para estudos sobre ionosfera terrestre, geofísica espacial, geomagnetismo, raios cósmicos e emissão solar. O projeto está sendo Financiado pela Finep, do Ministério da Ciência e Tecnologia.
Outro acordo de cooperação importante firmado pelo País na área espacial foi assinado em junho de 1995 com o Centro Nacional de Estudos Espaciais (CNES), da França, prevendo o desenvolvimento de outro satélite científico. O custo do programa está orçado em US$ 5 milhões, incluindo o lançamento do satélite pelo foguete francês Ariane.
A Argentina e o Brasil também estão planejando a construção de um satélite para observação de safras, enchentes e os problemas de meio ambiente, especialmente em regiões de fronteira. O Inpe começou a rever um projeto de construção e lançamento de satélites de comunicação de órbita equatorial baixa. O sistema será usado para telefonia móvel e de mensagem para regiões remotas, como o interior da floresta Amazônica.
Notícia
Gazeta Mercantil