São Paulo - A citricultura brasileira poderá ser palco de uma importante transformação nos próximos anos, com a incorporação de conhecimentos avançados em melhoramento genético e genômica. As pesquisas estão bastante adiantadas, disponibilizando novas variedades, mais resistentes às doenças e à seca.
O sistema produtivo, no entanto, ainda reage com lentidão às novidades, de acordo com Marcos Antonio Machado, coordenador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia de Genômica para o Melhoramento de Citros (INCT-Citros), apoiado pela Fapesp e pelo CNPq.
"Nossos produtores atendem prioritariamente à indústria de sucos e a indústria está mais interessada em quantidade de fruta do que em qualidade", disse o pesquisador do Centro de Citricultura Sylvio Moreira do Instituto Agronômico, ligado à Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo.
Em entrevista à Agência , Machado destacou os principais avanços registrados pela pesquisa na área nos últimos anos.
"O Consórcio Internacional do Genoma de Citros, do qual participamos, já obteve o genoma completo da clementina (Citros clementina), utilizado como genoma de referência para comparação com os genomas de outras espécies de citros, entre elas, a laranja-pera, a mais importante variedade de laranja brasileira, a tangerina ponkan e o limão-cravo, também utilizado como porta-enxerto. O INCT-Citros detém atualmente uma das mais importantes bases de dados sobre o genoma de citros", disse.
No estudo dos patógenos das doenças que afetam os citros, os avanços não têm sido menores. Depois dos sequenciamentos históricos dos genomas das bactérias Xylella fastidiosa (responsável pela clorose variegada dos citros) e Xanthomonas citri subsp. citri (responsável pelo cancro cítrico), concluídos no início dos anos 2000 com apoio da Fapesp, outros patógenos de citros estão sendo sequenciados, como os fungos causadores da pinta preta, da mancha marrom de alternaria e da queda prematura dos frutos, além do oomiceto causador da gomose.
"Nesses casos, graças aos avanços ocorridos na genômica, estamos não somente montando esses genomas, mas também avaliando a função de genes envolvidos na interação com as plantas hospedeiras", disse Machado, um dos pesquisadores do programa Genoma-Fapesp Xylella fastidiosa.
Segundo o pesquisador, essas e outras aquisições criaram uma massa crítica de conhecimentos capaz de favorecer tanto a cisgenia (transformação com genes de espécies próximas) como o melhoramento tradicional.
“A produção de citros transgênicos já é científica e tecnologicamente viável, mas depende de regulamentação. Ao mesmo tempo, os mapas genéticos que levantamos permitem identificar genes marcadores com os quais podemos calibrar a seleção genética tradicional, de forma que os genótipos selecionados correspondam precisamente aos fenótipos de interesse”, disse.
Nivelamento por baixo - Machado explica que novas potenciais variedades de copas e porta-enxertos com alta tolerância à seca e a doenças como clorose variegada dos citros, gomose, cancro cítrico e pinta preta já estão disponíveis. Mas, por uma característica do setor, o processo de incorporação tecnológica pelos produtores se dá muito lentamente. “Daqui a algum tempo, todos correrão atrás dessas variedades melhoradas, assim como hoje recorrem maciçamente a espécies selecionadas décadas atrás.”
Maior produtor de laranja e exportador de suco, responsável por atender 53% do consumo mundial, o Brasil ainda não possui, na opinião dos especialistas, uma citricultura satisfatória. O rendimento das plantações é considerado muito baixo, com produtividade média de apenas duas caixas de 40,8 kg por árvore ao ano.
Os grandes gargalos são, pela ordem, a alta incidência de pragas e doenças, a produção em áreas não irrigadas e a estreita base genética utilizada. “Estima-se que mais de 60% dos custos de produção sejam direcionados para o controle de pragas e doenças”, disse Machado.
Por Agência FAPESP