A necessidade de aumentar a produção e distribuição de energia no mundo somada à recente resolução de diversos países, como os Estados Unidos, de aumentar a utilização de combustíveis renováveis até 2021 deverão impulsionar globalmente a expansão da indústria de biocombustíveis nos próximos anos. Para atender a uma maior demanda mundial por bioenergia, contudo, o setor terá de superar desafios de diversas ordens.
Entre eles, aumentar o cultivo de culturas agrícolas utilizadas para obter biocombustíveis, sem afetar a produção de alimentos; adaptar-se aos impactos das mudanças climáticas globais na agricultura; e competir em condições desiguais com os combustíveis fósseis – que hoje são fortemente subsidiados em inúmeros países, incluindo no Brasil. As observações foram feitas por pesquisadores participantes do “Workshop Bioenergia e Sustentabilidade: a perspectiva da indústria”, realizado na FAPESP.
O encontro foi preparatório para o Processo Rápido de Avaliação (Rapid Assessment Process) sobre biocombustíveis e sustentabilidade que pesquisadores dos Programas FAPESP de Pesquisa em Bioenergia (BIOEN), em Caracterização, Conservação, Recuperação e Uso Sustentável da Biodiversidade do Estado de São Paulo (BIOTA) e sobre Mudanças Climáticas Globais (PFPMCG) realizarão, no início de dezembro, na sede da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), em Paris, na França.
A avaliação – realizada a convite da Secretaria do Comitê Científico para Problemas do Ambiente (Scope) da Unesco – deverá resultar em um “Resumo de políticas” contendo uma série de recomendações da academia, indústrias, instituições governamentais e não governamentais (ONGs) para apoiar a tomada de decisões relacionadas a biocombustíveis e sustentabilidade por parte de empresas, governos e instituições internacionais associados à Organização das Nações Unidas (ONU).
“O objetivo do trabalho de avaliação é, tendo em vista que a produção de bioenergia está se expandindo no mundo, contribuir com recomendações para políticas públicas que possam estimular a produção de biocombustíveis e eliminar algumas barreiras ao avanço dessa indústria globalmente”, disse Glaucia Mendes Souza, professora do Instituto de Química (IQ) da Universidade de São Paulo (USP) e membro da coordenação do BIOEN, na abertura do evento.
O estudo contará com a participação de 95 especialistas da área de biocombustíveis, provenientes de 56 instituições de pesquisa de 19 países, e deverá ser publicado na forma de um livro eletrônico (e-book) previsto para ser lançado em outubro de 2014.Os principais resultados também serão publicados em uma edição especial do Journal Environmental Development e anunciados na abertura da 2nd BBEST – Conferência Brasileira de Ciência e Tecnologia em Bioenergia (Brazilian Bioenergy Science and Technology Conference), prevista para ocorrer em outubro de 2014 em Campos do Jordão.
“A síntese do conhecimento sobre biocombustíveis e sustentabilidade que produziremos não será simplesmente uma revisão da literatura científica ou um tutorial sobre o tema”, afirmou Souza. “Pretendemos avançar na discussão por meio da abordagem de questões transversais relacionadas à produção de biocombustíveis, como segurança alimentar, energética, ambiental e climática e desenvolvimento sustentável e inovação”, contou.
Demanda de energia
De acordo com dados apresentados por pesquisadores participantes do encontro, obtidos da Agência Internacional de Energia (IEA, na sigla em inglês), a demanda por energia no mundo deverá dobrar nas próximas décadas, passando dos atuais 500 hexajoules (hj) para mil hexajoules em 2050.
A produção de óleo e gás, no entanto – que representam 60% da energia primária mundial –, deverá cair no mesmo período, tendo em vista que está diminuindo o número de reservas de petróleo e, em contrapartida, aumentam os custos para prospecção e extração de óleo e gás de novos campos petrolíferos, aponta o órgão.
Em razão desse cenário e com a finalidade de atender ao aumento da demanda mundial por energia, a IEA prevê que, em 2030, os biocombustíveis contribuirão com 4% a 10% – dependendo da introdução do etanol de segunda geração – no total da energia utilizada para transporte rodoviário no planeta.
Para isso, será necessário utilizar entre 3,8% e 4,5% da terra arável disponível mundialmente para o cultivo de culturas agrícolas destinadas à produção de biocombustíveis, contra 1% do total de terra usada hoje no mundo para essa finalidade.
Essa expansão da produção de biocombustíveis, no entanto, não deverá competir com a de alimentos, cuja demanda mundial também aumentará nos próximos 40 anos, estimam pesquisadores.