A quem interessa a descoberta de uma técnica baseada na aplicação de células-tronco que regenere o osso, possibilitando inúmeros tratamentos? E a criação de um antídoto para o vírus HIV? Ou ainda a invenção de um tratamento rápido e eficaz para a hanseníase?
Certamente, a busca de soluções para os muitos problemas que afligem a humanidade interessa a todo mundo, inclusive às grandes potências internacionais. E é neste cenário que Bauru está ganhando destaque.
Abrigando seis universidades e oito instituições que desenvolvem pesquisa, o município tem atraído a atenção e o investimento de diferentes partes do mapa mundi, interessadas em compartilhar parte do conhecimento produzido pelos 2.964 cientistas e pesquisadores da Cidade Sem Limites.
Centros de estudos científicos como o Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais da Universidade de São Paulo (HRAC-USP), conhecido como Centrinho, e o Instituto Lauro de Souza Lima (ILSL) tornaram-se referência em sua área de atuação e agora exportam conhecimento.
"Creio que as parcerias internacionais são muito importantes para quem trabalha com pesquisa. O interesse de outros países em nosso trabalho é uma conquista que lutamos para manter", avalia João Henrique Nogueira Pinto, diretor administrativo do Centrinho, que em 2010 firmou duas parcerias com universidades dos Estados Unidos e atraiu investimento de R$ 461.514,00.
Além dos dois estudos, o hospital também foi convidado a iniciar sua participação em uma pesquisa internacional sobre a melhor idade para a realização da cirurgia de palato, que envolve 23 centros craniofaciais de seis países europeus.
Centros de pesquisa como o Instituto de Pesquisas Meteorológicas (IPMet), o Hospital Estadual Bauru (HB), o Instituto Adolfo Lutz (IAL), a Sorri-Bauru, o Jardim Botânico e o Zoológico Municipal também contribuem para a produção de ciência da cidade e detêm prestígio em nível nacional.
Mas nem sempre o reconhecimento internacional é o mais difícil de ser conquistado. De acordo com pesquisadores entrevistados pelo Jornal da Cidade, o maior entrave está dentro da própria cidade, que não estabelece relações de apoio e não demonstra interesse pelas atividades desenvolvidas pelo meio acadêmico.
"A impressão que a gente tem é que é obrigação dos pesquisadores procurarem a prefeitura para dizer: "Olha, estamos desenvolvendo tal projeto que pode trazer determinado benefício". Mas, na verdade, isso é papel do município. Falta apoio, falta interesse, falta divulgação, falta orgulho", reclama Maria Inês Pegoraro-Krook, presidente da comissão de pesquisa do Centrinho.
Para Roberto Calheiros, vice-diretor do IPMet, a falta de interação entre a prefeitura e a Academia despreza os resultados alcançados nas pesquisas. "Nosso papel é descobrir quando vai ter uma tempestade, qual sua intensidade, onde ela vai atingir, quanto tempo vai durar, etc. E nós fazemos isso. Mas de que adianta se quando passamos a informação para os órgãos competentes nada é feito? É preciso trabalhar junto", defende o pesquisador.
Setor exige organização
Para que Bauru tenha seu potencial em ciência e tecnologia reconhecido é preciso organização. Uma boa parte do caminho, que é a produção de pesquisas de alto nível, a cidade já percorreu. Faltam agora esforços conjuntos entre prefeitura e Academia para colocar o conhecimento em prática.
Na opinião do ministro da Ciência e Tecnologia, Aloísio Mercadante, o descolamento entre ciência e produção tem de ser superado.
"Todo conhecimento científico deve encontrar a sua aplicação prática. Todo conhecimento científico pode e deve contribuir para aumentar a nossa competitividade e melhorar a qualidade de vida de todos os brasileiros. Cabe aos municípios estimularem ações integradas com quem produz ciência em benefício de todos", frisa.
Para Carlos Henrique de Brito Cruz, diretor científico do Fundo de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), a intensidade da atividade científica e tecnológica em uma cidade resulta de sua capacidade de gerar conhecimento e, quando isso acontece, a região intensifica seu desenvolvimento socioeconômico, ampliando a capacidade de competir por mais recursos e gerar mão de obra qualificada.
E para alçar voos maiores e ultrapassar o céu da Cidade Sem Limites, a sugestão defendida por pesquisadores e centros acadêmicos é a criação de uma Secretaria Municipal de Ciência e Tecnologia. O modelo, implementado em outras cidades, como São Carlos, é elogiado por instituições de fomento à pesquisa e grandes nomes da ciência.
"Criar um órgão que pense e implemente políticas públicas de ciência e tecnologia contribui para definir a estratégia de desenvolvimento socioeconômico da cidade, de forma que o município torne-se atrativo para investidores e receba mão de obra qualificada e parcerias com outros municípios, Estados e países", sustenta Carlos Henrique de Brito Cruz, da Fapesp.
A mesma opinião é compartilhada por Marcos Alberto Martinelli, secretário do Desenvolvimento Sustentável, Ciência e Tecnologia de São Carlos, para quem o assunto merece uma pasta específica.
"Uma secretaria de Ciência e Tecnologia é a melhor forma de aproveitar e gerir o conhecimento produzido na cidade. É um agente organizador. É impensável ter uma solução para um problema e simplesmente desperdiçá-la", conclui.
Contudo a criação da pasta ainda não faz parte dos planos dos dirigentes da cidade. Na semana retrasada, entrevistado para a produção do primeiro JC nos Bairros sobre o tema, o prefeito Rodrigo Agostinho deixou claro que criar uma pasta de ciência e tecnologia não está entre as prioridades do município.
Esta semana, procurado pela reportagem, o presidente da Câmara Municipal, vereador Roberval Sakai, não respondeu às ligações da reportagem.
Já na opinião do vereador Paulo Eduardo de Souza (PSB), Bauru está atrasada quando o assunto é ciência e tecnologia. Não por falta de produção científica, mas, sim, por falta de aplicação do conhecimento produzido.
"Sou a favor da criação de uma Secretaria de Ciência e Tecnologia e penso que estamos atrasados neste sentido. Entendo que a cidade tem alguns problemas estruturais urgentes, mas é preciso consertar a bicicleta com ela andando", avalia.