Pesquisadores brasileiros desenvolveram um aplicativo de celular que auxilia na reabilitação de pessoas que sofreram acidente vascular cerebral (AVC). A partir de um sensor (acelerômetro) que permite detectar a inclinação do próprio aparelho telefônico preso à roupa do indivíduo, o programa permite identificar a postura e avisar o usuário como melhorar o alinhamento corporal, seja por comando de voz, vibração ou por imagem.
O dispositivo atua na reabilitação de um problema conhecido como hemiparesia, uma das sequelas mais desafiadoras do AVC e que também pode surgir em decorrência de lesões no cérebro ocasionadas por doenças como esclerose múltipla, paralisia cerebral e alguns tipos de câncer. Nesses casos, ocorre a perda de força muscular ou paralisia parcial em um lado do corpo, além de prejuízos na consciência corporal.
“A pessoa com hemiparesia perde a sensibilidade e a percepção de organização espacial. Com isso, ela tomba para um lado, por exemplo, e não percebe que isso aconteceu, chegando até a apresentar dores musculares em virtude do mau posicionamento”, explica Amanda Polin Pereira, professora do Departamento de Terapia Ocupacional da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e primeira autora do artigo publicado na revista JMIR Aging.
“Sem a postura correta, o paciente não consegue executar tarefas cotidianas, como caminhar, cozinhar, dirigir ou subir uma escada, por exemplo. Dessa forma, tanto a consciência corporal quanto o controle do tronco, perdidos com o AVC, precisam ser reaprendidos para garantir a funcionalidade dos membros superiores”, complementa Amanda.
Trabalho
O desenvolvimento do software, concebido a partir de uma necessidade observada por Amanda, ocorreu durante o doutorado de Olibário José Machado Neto, bolsista da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) no Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação da Universidade de São Paulo (ICMC-USP).
A pesquisa se deu no escopo de dois projetos apoiados pela Fundação e contou com colaboradores da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP-USP).
“Do ponto de vista de desenvolvimento de software, foi um trabalho de codesign que uniu duas áreas de conhecimento distintas para atender às necessidades dos pacientes. Isso deu muita agilidade e embasamento para o desenvolvimento do aplicativo, que é totalmente único. Não há nada parecido na clínica que auxilie o tratamento e a reabilitação desses pacientes”, destaca Maria da Graça Campos Pimentel, professora do ICMC-USP e orientadora de Machado Neto.
Três versões de aplicativo
Foram desenvolvidas três versões do app. “Iniciamos com a ideia de um aplicativo vestível, mas notamos que, quanto mais simples ele fosse, melhor seria a sua aceitação entre os pacientes. Focamos no desenvolvimento do software e, em vez de criar roupas especiais, optamos por costurar bolsos em tops ou regatas que pudessem fixar o aparelho de celular no tronco dos pacientes”, conta Maria da Graça.
“Por fim, criamos uma tecnologia vestível acessível, que aproveita os recursos de smartphones de baixo custo e de acelerômetros integrados ao celular para monitorar continuamente as mudanças (da direita para a esquerda e para frente e para trás), explorando os feedbacks visual, tátil e auditivo do dispositivo para orientar os pacientes em pé”, explica a pesquisadora.
Segundo Maria da Graça, o intuito final do trabalho é disponibilizar o aplicativo gratuitamente e alavancar novos estudos a partir dos dados gerados sobre hemiparesia. “O que precisamos agora é de uma colaboração para manter o aplicativo sempre atualizado, algo que demanda tempo de trabalho e investimento financeiro.”
Passo a passo
Os testes foram conduzidos em um centro de reabilitação. Ao longo do processo, os pesquisadores entrevistaram fisioterapeutas e terapeutas ocupacionais para compreender as necessidades de tratamento. Os pacientes em reabilitação também foram consultados.
Agência SP