Um caminho de esperança para quem enfrenta uma das doenças mais cruéis existentes ganhou a atenção do mundo ontem. O prêmio Nobel de Medicina ou Fisiologia laureou os pesquisadores James P. Allison, dos Estados Unidos, e Tasuku Honjo, do Japão, pela descoberta de uma terapia contra o câncer por inibição da regulação imunológica negativa. Os dois vão dividir o prêmio de 9 milhões de coroas suecas (cerca de US$ 1 milhão).
Para os organizadores da premiação, a descoberta constitui um marco na luta contra o câncer por estimular a capacidade do sistema imunológico de atacar as células cancerígenas soltando os freios das células do sistema imunológico.
Ao estimular a capacidade do nosso sistema imunológico de a tacar células tumorais, os pesquisadores estabeleceram um princípio inteira mente novo para enfrentar o câncer, trazendo mais alternativas às tradicionais terapias, como cirurgia, radioterapia e quimioterapia.
O comitê do Nobel lembrou que tentativas de estimular o sistema imune para esse fim já vinham ocorrendo desde o final do século XIX.
Ocorre que o funciona mento do sistema imunológico está baseado no reconhecimento do que são células próprias do corpo das que são invasoras, como uma bactéria ou um vírus, para assim poder atacá-las e eliminá-las. Células cancerígenas, como são mu tações das nossas próprias células, acabam confundindo as defesas do organismo.
FREIOS
Os dois pesquisadores estudaram , de modo independente, proteínas que atuam como uma espécie de freio das chamadas células T do sistema imune.
James P. Allison, 70, chefe do Departamento de Imunologia do MD Anderson Cancer Center , da Universidade do Texas, foi o primeiro, no início dos anos 1990 , a investigar o funcionamento da proteína conhecida como CTLA-4, que tem essa função de se ligar à célula T, impedindo sua ação.
A proteína já estava na mira de vários pesquisadores para o tratamento de doenças auto imunes, mas o americano foi o primeiro a ver uma forma de bloquear a proteína, para assim liberar o sistema imune para atacar as células de câncer.
Nos primeiros testes com camundongos, os resultados foram promissores. Allison e equipe conseguiram curar os animais com o uso de anticorpos que impediam esse freio natural e liberar a atividade das células T. Mais pesquisas foram feitas até chegar aos testes clínicos com seres humanos. Em 2010, um deles conseguiu o e feito esperado em pacientes com melanoma (câncer de pele) avançado. Os sinais da doença desapareceram em vários pacientes.
Em 2011, o governo americano aprovou o primeiro medicamento baseado nessa descoberta e ele passou a ser usado no tratamento de melanomas. Allison disse que a terapia já está sendo usada contra outros tipos de câncer como o de pulmão.
O trabalho de Tasuku Honjo, 76, pesquisador da Universidade de Kyoto, teve início em 1992. Ele descobriu que outra proteína, a PD- 1, também funciona como um freio para as células T, mas em um mecanismo diferente da CTLA- 4.
Em 2012, um estudo clínico demonstrou eficácia no tratamento de pacientes com diferentes tipos de câncer. Houve remissão a longo prazo e possível cura em vários pacientes, inclusive em alguns com câncer já metastático, condição até então considerada intratável.
Para o comitê do Nobel, as possibilidades de tratamentos que se seguiram às descobertas "mudaram funda mentalmente o resultado para certos grupos de pacientes com câncer avançado".
"Os cientistas ambicionam simplesmente forçar as fronteiras do conhecimento, e minha intenção não era estudar o câncer, mas entender a biologia das células T, essas células incríveis que correm pelo nosso corpo para protegê-lo", falou Allison ao comemorar o prêmio. Já Honjo disse que sua intenção é "continuar com a pesquisa para que a imunoterapia salve mais pacientes com câncer do que nunca". Os organizadores do Nobel lembraram que, como ocorre com outras terapias, há efeitos colaterais que podem até mesmo colocar em risco a vida dos pacientes. Em alguns casos foi observada uma res posta imune hiperativa, mas em geral são gerenciáveis.
AVANÇO DO CÂNCER
De acordo com d ados da Agência para a Pesquisa do Câncer, entidade ligada à Organização Mundial da Saúde (OMS), o câncer avança e 18,1 milhões de novos casos serão registrados em 2018 no mundo, com um total de 9,6 milhões de mortes. Se nada for feito, o levantamento alerta que as incidências vão atingir 29,4 milhões de novos casos em 2040 , uma expansão de 63% nos próximos 20 anos. A mortalidade deve subir de 9,6 milhões de pessoas hoje para 16,3 milhões em 2040.
No Brasil, a pesquisa apontou 559 mil novos casos de câncer, com 243 mil mortes, em 2018. E as projeções da doença para 2040 avaliam um aumento de 78,5%, com 998 mil novos casos registra dos. Alguns planos de saúde no Brasil já cobrem o tratamento baseado nas descobertas de Allison e Honjo. Porém, o Sistema ú nico de Saúde (sus) não oferece esse tipo de tratamento. No entanto, pacientes podem conseguir o tratamento gratuito se participarem de grupos de pesquisas clínicas em hospitais de referência em Oncologia.
Cientistas brasileiros também avançam na pesquisa
Pesquisadores brasileiros criaram um biossensor capaz de diagnosticar precocemente o câncer de pâncreas, considerado um tipo de tumor raro no Brasil, porém alta mente letal por ter sintomas que demoram para aparecer e quando dão sinais indicam que a doença já está em estágio avançado, tornando o tratamento mais difícil.
Os cientistas do Instituto de Física de São Carlos, da Universidade de São Paulo (IFSC-USP), em parceria com o Labora tório Nacional de Nanotecnologia (LNNano), do Hospital de Câncer de Barretos, e a Universidade do Minho, de Portugal, construíram um dispositivo de baixo custo que consegue detectar o biomarcador do câncer de pâncreas com alta sensibilidade e seletividade.
"Conseguimos fazer um biossensor de baixo custo capaz de detectar o biomarcador do câncer de pâncreas em amostras reais de sangue e de células tumorais em uma faixa de relevância clínica", disse um dos criadores do marcador, o professor do IFSC - USP Osvaldo Novais de Oliveira Junior.
De acordo com a Fapesp, que apoia o projeto, o dispositivo é formado por duas lâminas em escala nanométrica (da bilionésima par te do metro) , compostas por ácidos e anticorpos que reconhecem o antígeno CA19- 9, proteínas existentes nas células cancerígenas.
Atualmente, a detecção do CA19 - 9 é feita por meio do teste Elisa, que é um exame de sangue de alto custo e sensibilidade limitada, sendo difícil para detectar câncer de pâncreas em estágio inicial.
Com, agências