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Avanços da genômica do eucalipto

Publicado em 01 junho 2004

Por Dano Grattapaglia
Engenheiro florestal, PhD em genética pela North Carolina State University; pesquisador da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia; professor de ciências genômicas da Universidade Católica de Brasília; coordenador do projeto Genolyptus Ganhos extraordinários em produtividade e qualidade das florestas industriais de eucalipto têm sido feitos nos últimos 20 anos, aplicando-se os princípios da genética quantitativa, aliados a uma revolução nos procedimentos silviculturais, com destaque para a clonagem em larga escala de árvores elite. Nas próximas décadas, incrementos de produtividade e qualidade das florestas via melhoramento genético tornar-se-ão cada vez mais estratégicos para o crescimento sustentado è a manutenção da vantagem competitiva dos países plantadores na produção de celulose do eucalipto. O desenvolvimento das ciências genômicas, integradas às estratégias da genética clássica, abre perspectivas de enorme potencial para desvendar as relações complexas entre variabilidade genética na seqüência de DNA e a diversidade observada entre árvores para produtividade, qualidade e tolerância a doenças e stress ambientais. O que se espera da genômica é, assim, um outro salto equivalente que permitirá, por exemplo, a seleção precisa de clones elite em idade precoce com base na identificação direta da constituição genômica superior para características físico-químicas da madeira. No Brasil, dois projetos de pesquisa do genoma do eucalipto foram iniciados paralelamente entre 2001 e 2002. O projeto Forests, financiado pela Fapesp e por quatro empresas paulistas, anunciou em 2002 a finalização de um banco de 120 mil seqüências de genes expressos de Eucalyptus grandis. Já o projeto Genolyptus, iniciado em meados de 2002, se baseia em uma parceria entre o governo federal, por meio do Ministério da Ciência e Tecnologia (Fundo Setorial Verde Amarelo); os setores acadêmico e de pesquisa, representados por sete universidades e três centros da Embrapa, e o setor privado, por meio de 13 empresas florestais, 12 brasileiras e uma portuguesa. Concebido dentro de um inovador espírito pré-competitivo, o projeto Genolyptus envolve mais de 50 pesquisadores e estudantes e se baseia na geração de urna plataforma integrada de recursos experimentais e bases de dados genômicos para descobrir, mapear, validar e entender a variação subjacente nos genes e nas regiões genômicas de importância econômica em Eucalyptus, com ênfase no processo de formação da madeira e resistência a doenças. O projeto Genolyptus completou em dezembro de 2003 uma coleção de mais de 130 mil seqüências geradas a partir de genes e DNA de quatro espécies de Eucalyptus, buscando assim capitalizar os potenciais interespecíficos do gênero. Essa coleção cobre os estimados 30 mil a 40 mil genes do eucalipto e permitiu a identificação de todos os genes de lignificação e síntese de celulose nas diferentes espécies, bem como a realização de estudos de expressão diferencial via bioinformática. Essa base de dados estará sendo transferida para as empresas participantes em 2004, juntamente com a coleção completa de todos os fragmentos de DNA seqüenciados, concretizando, assim, os dois primeiros produtos do projeto. Indo além de um típico projeto genoma, entretanto, o projeto Genolyptus se fundamenta em uma estratégia de interconexão entre as diferentes tecnologias genômicas, experimentação de campo, tecnologia da madeira e fitopatologia. Entre 2002 e 2003 foi realizado um importante trabalho de interação entre as empresas participantes na geração e instalação da rede experimental de campo. Esse trabalho, absolutamente fundamental para o sucesso do projeto, demandou a mobilização de dezenas de pessoas e recursos materiais e logísticos nas várias empresas. A rede experimental envolve cinco regiões do País desde o Rio Grande do Sul até o Pará e, com o ingresso de Portugal no projeto, novas populações e material genético de E. globulus, consolidando assim uma base experimental inédita em nível mundial. A interação estreita entre os cientistas das instituições públicas e privadas tem permitido grandes avanços na área de tecnologia da madeira e de fitopatologia. Foram internalizadas e validadas novas metodologias de avaliação das propriedades químicas da madeira necessárias para a avaliação precisa e rápida de milhares de árvores no âmbito do projeto. Árvores que apresentam resistência às quatro doenças bacterianas ou fúngicas alvo do projeto foram identificadas após um detalhado trabalho de inoculação controlada de plantas fornecidas pelas empresas. O desenvolvimento paralelo de mapas genéticos de alta resolução já permitiu a localização de segmentos do genoma que controlam as características de densidade básica da madeira, teor de hemiceluloses e lignina, florescimento e resistência a ferrugem. De forma pioneira no mundo, está sendo desenvolvido também o primeiro mapa físico do genoma do eucalipto, ferramenta-chave para o isolamento de genes completos e elementos reguladores. Esses trabalhos de mapeamento, aliados à base de dados de seqüenciamento, abrem perspectivas concretas para a manipulação de características de relevância silvicultural e industrial. Vale por fim destacar que o projeto Genolyptus tem um caráter pré-competitivo, correspondendo a uma etapa na qual um grande volume de trabalho de base está sendo realizado, esforço que possivelmente nenhuma empresa ou instituição de pesquisa individualmente teria fôlego para realizar. Para que a promessa da genômica se concretize na produção florestal, entretanto, é fundamental que, já a partir de 2004 e principalmente com a finalização do Genolyptus em 2006, as empresas empreendam projetos internos, explorando a base de conhecimento e tecnologias desenvolvidas de acordo com suas respectivas estratégias empresariais.