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Avanço contra diabetes do tipo 1 (1 notícias)

Publicado em 18 de abril de 2007

Por Marcos Pivetta

Com quimioterapia e transplante de células-tronco, pesquisadores brasileiros livram 14 pacientes da necessidade de receber injeções de insulina.

Num trabalho inédito no mundo, que mereceu nove páginas e menção no editorial da edição de 11/04 do Journal of the American Medical Association (Jama), pesquisadores do Centro de Terapia Celular (CTC) da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, ligada à Universidade de São Paulo, mostram que um tratamento ainda experimental contra o diabetes melito do tipo 1, também chamado de juvenil ou insulino-dependente, é realmente promissor.

Por meio de uma abordagem clínica que recorre a altas doses de quimioterapia seguidas de um transplante de células-tronco adultas originárias da medula do próprio paciente, a equipe do imunologista Julio Cesar Voltarelli, do CTC, um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepid) financiados pela FAPESP, conseguiu livrar 14 diabéticos recém-diagnoticados, com idade entre 14 e 31 anos, da necessidade diária de tomar doses de insulina.  "A grande interrogação de nosso trabalho é saber se os efeitos do tratamento são duradouros ou temporários", diz Voltarelli, principal autor do artigo científico publicado no Jama. "Ainda vamos ter de acompanhar a evolução dos pacientes por muito tempo." O diabetes do tipo 1 é provocado por um ataque do sistema imunológico do próprio paciente às células beta do pâncreas, que produzem a insulina, hormônio cujo papel central é retirar açúcar do sangue. 

É cedo, portanto, ainda para se falar em cura dessa forma de diabetes, que afeta aproximadamente 1 milhão de brasileiros. Mas os resultados da nova abordagem terapêutica, que recorre a um conjunto de procedimentos caros, demorados e, em certa medida, arriscados, são animadores. Um dos pacientes já está sem tomar insulina há 35 meses. Outros quatro não vêem as agulhas há pelo menos 21 meses e sete estão livres das injeções há seis meses. Em dois pacientes, o tratamento experimental não produziu resultados imediatos. No entanto, mais de um ano depois de terem se submetido à quimioterapia seguida de transplante de células-tronco, eles também deixaram de ser dependentes de insulina. De todos os pacientes, apenas um teve uma recaída e voltou a receber injeções de insulina. Os efeitos colaterais da abordagem clínica, sem dúvida agressiva, foram, por ora, brandos: um doente teve pneumonia, e dois, disfunções endócrinas.

 

A abordagem terapêutica testada em Ribeirão Preto atua em dois tempos. Primeiro, os pesquisadores praticamente destroem todo o sistema imunológico do doente (que desencadeia a agressão contra as células beta) por meio da quimioterapia. Em seguida, fazem no diabético um transplante com células-tronco da medula do próprio paciente que, antes da quimioterapia, haviam sido retiradas e separadas para esse procedimento. O transplante acelera o processo de restabelecimento de um novo sistema imunológico, capaz, de acordo com o estudo dos brasileiros, de não apresentar a disfunção inflamatória que redunda no ataque às células do pâncreas responsáveis pela fabricação de insulina. Mas, para que a dobradinha quimioterapia e transplante de células-tronco possa ter chance de funcionar, é preciso selecionar bem os pacientes que serão submetidos ao experimento. Todos os indivíduos que, de alguma forma, se beneficiaram do tratamento  haviam recebido o diagnóstico formal de diabetes há no máximo seis semanas.

Nos estágios iniciais da doença, ainda resta uma pequena quantidade de células beta capaz de gerar insulina. Se essas células do pâncreas forem preservadas, o organismo, uma vez livre da disfunção imunológica, pode retomar sua produção normal do hormônio. "O estudo de Voltarelli é o primeiro de muitas tentativas de terapia celular que provavelmente serão testadas para deter o avanço do diabetes do tipo 1", afirma, em editorial do Jama, o pesquisador Jay S. Skyler, do Instituto de Pesquisa em Diabetes da Universidade de Miami.