Anvisa publicou, na quarta-feira (30/8), a autorização para o início de uma nova etapa do ensaio clínico com a SpiN-Tec MCTI UFMG, uma candidata à vacina para Covid-19 desenvolvida pelo Centro de Tecnologia de Vacinas (CTVacinas) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). O estudo é financiado pela UFMG, pelo Ministério da Ciência e Tecnologia e Inovação (MCTI), pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e pela Prefeitura de Belo Horizonte (PBH).
A SpiN-Tec é uma proteína quimérica recombinante que utiliza a proteína SpiN, que é uma associação da porção RBD da proteína Spike (S) com a proteína do nucleocapsídeo (N). O RBD interage diretamente com o receptor da célula hospedeira do vírus.
Traduzindo: 1) Proteína quimérica é uma proteína criada através da união de dois ou mais genes ou ainda por ligações químicas, que originalmente codificavam proteínas separadas. 2) Uma proteína recombinante é produzida a partir de processos biotecnológicos (técnicas de clonagem molecular) e é uma alternativa eficiente à extração de proteínas de duas fontes originais. 3) O nucleocapsídeo é uma estrutura viral formada pela associação do capsídeo (espécie de revestimento de origem proteica do vírus, que protege e impede sua proliferação) com o ácido nucléico (biomoléculas mais importantes do controle celular, pois contêm a informação genética; estão presentes em todas as células vivas e são responsáveis pelo armazenamento e transmissão da informação genética). 4) A porção RBD (do inglês receptor-binding domain – domínio de ligação ao receptor) da proteína S1 do vírus é a região onde ocorre a conexão ao receptor celular ACE 2, responsável por fazer a ligação com as células do corpo humano e infectá-las. 5) A proteína Spike (proteína da “espiga” viral) é associada à capacidade de entrada do vírus nas células humanas e é um dos principais alvos dos anticorpos neutralizantes produzidos pelo organismo para bloqueá-lo.
O protocolo de ensaio clínico da vacina SpiN-Tec é de fase 1/2 e foi subdividido em três partes:
- Parte A: ensaio clínico de fase 1 de dose escalonada, para verificar a segurança e a reatogenicidade (capacidade de geração de uma reação adversa no organismo pela vacina, geralmente decorrente de uma resposta imunológica excessiva) da vacina em indivíduos com idade entre 18 e 54 anos.
- Parte A2: ensaio clínico de fase 1b, utilizando a dose de 60μg, selecionada na Parte A do estudo, para verificar a segurança na população de 55 a 85 anos.
- Parte B: ensaio clínico de fase 2, para estudo da segurança e da imunogenicidade (capacidade de uma substância estranha – antígeno – provocar uma resposta imune – criação de anticorpos – no organismo) da SpiN-Tec MCTI UFMG, em indivíduos com idade entre 18 e 85 anos.
O início da primeira fase do ensaio clínico (etapas A e A2) foi autorizado pela Anvisa em outubro de 2022, e, com base nos resultados preliminares de segurança e imunogenicidade obtidos nessa fase, foi autorizado o prosseguimento do ensaio clínico para as fases seguintes (etapas A2 e B).
O objetivo dessa nova fase é obter dados adicionais de segurança e imunogenicidade, utilizando-se a dose que apresentou melhor desempenho na primeira fase (60μg). Nessa fase, o comparador usado inicialmente, a vacina Covishield® (AstraZeneca), será substituído pela vacina Comirnaty® Bivalente (Pfizer), para que seja avaliado o desempenho da vacina SpiN-Tec contra a variante e subvariantes prevalentes da Ômicron. A SpiN-Tec MCTI UFMG será utilizada como reforço vacinal heterólogo (administração de uma vacina com plataforma tecnológica diferente da que foi usada para concluir o esquema primário de vacinação) e será avaliada tendo como referência o comparador ativo, que será o reforço homólogo (aplicação de uma dose adicional do mesmo imunizante tomado anteriormente) ou heterólogo à vacinação primária.
Nessa nova fase, serão incluídos participantes saudáveis de ambos os sexos, com idade entre 18 e 85 anos, que completaram o esquema vacinal primário para Covid-19 utilizando CoronaVac® ou Covishield®, tendo recebido uma ou duas doses de reforço com Covishield® ou Comirnaty® há pelo menos 6 meses. Os participantes poderão ter tido infecção natural prévia pelo Sars-CoV-2 há pelo menos 6 meses da sua data de inclusão no ensaio clínico.
O ensaio clínico está sendo realizado em três centros localizados em Belo Horizonte/MG (Faculdade de Medicina da UFMG, Centro Freira de Pesquisa Clínica e Centro Infection Control). Serão incluídos cerca de 372 voluntários, sendo 12 na Parte A2 e 360 na parte B. O recrutamento dos voluntários é de responsabilidade dos centros que conduzem a pesquisa.
Autorização
Para esta autorização, a Anvisa analisou os dados das etapas anteriores de desenvolvimento dos produtos, incluindo estudos não clínicos in vitro e em animais, bem como dados preliminares de estudos clínicos em andamento. Os estudos não clínicos têm como principal objetivo identificar qual a terapia candidata que apresenta a maior probabilidade de sucesso, avaliar a sua segurança e criar bases científicas sólidas antes da transição para as fases de desenvolvimento clínico. A expressão latina in vitro designa todos os processos biológicos realizados fora dos sistemas vivos, no ambiente controlado e fechado de um laboratório, e que são feitos normalmente em recipientes de vidro.
Todos os ensaios clínicos autorizados pela Agência com medicamentos e produtos biológicos, além do nome das empresas, centros e investigadores envolvidos, podem ser consultados no portal da Anvisa, na página Consultas - Agência Nacional de Vigilância Sanitária (anvisa.gov.br).
Priorização de análise
Para a aprovação do ensaio clínico, a Agência realizou reuniões com a equipe da UFMG, a fim de alinhar todos os requisitos técnicos necessários para os testes, e avaliou todas as evidências apresentadas, em caráter prioritário.
O que são ensaios clínicos
Os ensaios clínicos são os estudos de um novo medicamento realizados em seres humanos. A fase clínica serve para validar a relação de eficácia e segurança do medicamento, bem como validar novas indicações terapêuticas.
Dentro desse ensaio, existem três fases (I, II, III), onde são colhidas informações sobre atividade, funcionamento e segurança do medicamento ou vacina, para que o produto possa ser liberado ao mercado e usado em pacientes junto com o tratamento padrão da pesquisa.
Para realização de qualquer pesquisa clínica envolvendo seres humanos, é obrigatória a aprovação dos Comitês de Ética em Pesquisa (CEPs) e/ou da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep).
A aprovação de uma pesquisa clínica pela Anvisa se aplica somente às pesquisas clínicas que têm a finalidade de registro e pós-registro de medicamentos, por solicitação de empresas patrocinadoras ou de seus representantes.
O prazo para início do estudo clínico após a aprovação ética e regulatória é definido pelo patrocinador do estudo.