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Aumento do risco de incêndios em áreas naturais exige estratégias de prevenção com embasamento científico (34 notícias)

Publicado em 26 de julho de 2021

Recentes incêndios de grandes proporções na Amazônia e no Pantanal, aliados ao aumento no risco de novos eventos desse tipo causados pelas mudanças climáticas, pelas mudanças no uso da terra e pela falta de um manejo adequado deste problema, compõem um panorama complexo que mobiliza pesquisadores da Ecologia e de áreas correlatas. A importância do tema e a necessidade de que o assunto seja debatido com bases científicas uniram 11 pesquisadores de diferentes instituições na autoria do artigo Understanding Brazil’s catastrophic fires: causes, consequences and policy needed to prevent future tragedies , publicado em 21 de julho no periódico Perspectives in Ecology and Conservation . Com base no entendimento das causas e dos efeitos do fogo no conjunto dos ecossistemas e biomas brasileiros, o estudo propõe abordagens eficazes de prevenção de incêndios e de manejo do fogo.

O professor do Departamento de Botânica da UFRGS Gerhard Overbeck , um dos autores do texto, explica que esse tema é complexo e que, muitas vezes, o debate em torno do assunto se baseia em preconceitos. Ele alerta que o risco de eventos graves de incêndios poderá aumentar, por isso o País precisa estar preparado. Segundo o pesquisador, é necessário definir políticas e estratégias de manejo que levem em conta os processos naturais e socioculturais envolvidos – como as mudanças climáticas, ciclos de seca, tipo de vegetação, desmatamento para o avanço da fronteira agrícola, usos tradicionais na pecuária ou para extrativismo, por exemplo – e que tenham uma base científica sólida.

Overbeck relata que o estudo foi conduzido no âmbito do Grupo de Trabalho de Políticas Públicas da Associação Brasileira de Ciência Ecológica e Conservação (Abaeco) . Diante da importância de enfrentamento urgente do problema, o grupo de pesquisadores, assessorados por gestores públicos e políticos, reuniu-se em um workshop online em outubro de 2020, a fim de analisar as questões que envolvem os incêndios em áreas naturais e elaborar o estudo, buscando oferecer uma revisão atualizada sobre o tema não só para o público acadêmico, mas também para gestores e formuladores de políticas ambientais. O apoio financeiro foi do Programa Biota/Fapesp e do CNPq por meio do Centro de Síntese em Biodiversidade (SinBiose) e do edital PrevFogo/Ibama.

Na publicação, os pesquisadores mostram que o Brasil possui biomas e ecossistemas com diferentes respostas ao fogo. Enquanto as florestas tropicais (como a Amazônia e a Mata Atlântica) são extremamente vulneráveis às queimadas, os campos naturais e savanas (como os Campos Sulinos e o Cerrado) apresentam adaptações ao fogo e têm muitos de seus processos ecológicos dependentes dele. No entanto, mesmo os ecossistemas adaptados respondem de forma diferente, dependendo do tipo, da frequência, da sazonalidade, da intensidade e da extensão da sua ocorrência. O esquema gráfico abaixo mostra como as causas e os efeitos do fogo afetam cada tipo de ecossistema.

Desde 2014 o Brasil conta com uma Estratégia de Manejo Integrado do Fogo que procura controlar a quantidade de material de fácil combustão e diminuir o risco de incêndios florestais. Essa estratégia permite a integração de práticas tradicionais de gestão de incêndios das populações locais ao manejo das áreas protegidas, mas ainda não foi amplamente implementada em todo o país. Os pesquisadores apontam a necessidade de formulação de uma estratégia geral clara para lidar com o fogo em terras privadas, permitindo seu uso controlado quando for benéfico e evitando-o quando os efeitos negativos forem dominantes.

Segundo Overbeck, uma pesquisa que vem sendo realizada no Parque Nacional da Lagoa do Peixe (no litoral do Rio Grande do Sul) analisa o uso do fogo para a restauração de áreas degradadas pelo plantio do Pinus. “Conseguimos demonstrar que ele pode ser importante para essa restauração, porque remove a serrapilheira, permitindo o recrutamento de espécies nativas, e impede a reinvasão do Pinus ao queimar as sementes”, explica o pesquisador. O estudo integra o projeto de pesquisa Restauração ecológica de campos de dunas no Parque Nacional Lagoa de Peixe , financiado pela Fundação Grupo O Boticário e conduzido por pesquisadores do Laboratório de Estudos em Vegetação Campestre da UFRGS (LEVCamp) , coordenado por Overbeck.

No estudo, os pesquisadores também fazem um resgate de percepções históricas e políticas relacionadas ao uso e gestão do fogo no Brasil. Eles mostram que o País já teve iniciativas de sucesso unindo os setores público e privado, demonstrando que é possível alcançar desenvolvimento socioeconômico com objetivos de conservação ambiental. Overbeck destaca que é falso o conflito entre agricultura e meio ambiente. “A manutenção dos ecossistemas naturais é fundamental para a qualidade de vida e para a produção agrícola”, afirma.

Por fim, os pesquisadores elencam cinco pontos fundamentais para avançar na prevenção dos incêndios e na definição de estratégias eficazes de manejo. São eles:

1. Disponibilização de base de informações calcada em pesquisas científicas e com acesso a dados remotos em tempo real;

2. Desenvolvimento do manejo do fogo de forma integrada com outros campos de políticas – especialmente aquelas relacionadas à posse e manejo da terra – e de acordo com a agenda de mudanças climáticas, contando com fiscalização eficiente e combate aos incêndios ilegais, assim como incentivo à adoção de técnicas alternativas aos incêndios pelos usuários da terra;

3. Manutenção das agências governamentais devidamente equipadas e treinadas para a atuação, inclusive com a implementação de sistemas de monitoramento e programas de capacitação local;

4. Definição de uma agenda de pesquisa nacional integrando diferentes áreas do conhecimento para o desenvolvimento de paisagens que sejam mais resistentes ao fogo; e

5. Educação e divulgação envolvendo todos os profissionais que lidam com a conservação de recursos naturais e manejo do fogo para fomentar um entendimento mais profundo sobre seu papel nos diferentes ambientes. [2]

[1] Foto: Mayke Toscano/Secom-MT.

[2] Texto de Patrícia Barreto dos Santos Lima.

Como citar esta notícia: UFRGS. Aumento do risco de incêndios em áreas naturais exige estratégias de prevenção com embasamento científico. Texto de Patrícia Barreto dos Santos Lima. Saense. https://saense.com.br/2021/07/aumento-do-risco-de-incendios-em-areas-naturais-exige-estrategias-de-prevencao-com-embasamento-cientifico/. Publicado em 26 de julho (2021).