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A Tribuna Piracicabana online

As universidades e as empresas têm sido domínios distintos e distantes

Publicado em 30 julho 2009

O Brasil evolui na produção de conhecimentos científicos. Chegou ao 13º posto em artigos na base de dados Thomson Reuters - ISI, entre 183 países, fato comemorado pelo Ministério da Educação. A boa nova, celebrada com justiça, pode servir para enfim colocarmos em pauta o encaminhamento de um problema que há anos limita a velocidade de crescimento do setor de inovação no Brasil: existe um espaço não preenchido, um hiato, entre os resultados das pesquisas, geralmente nas maiores universidades públicas, e as demandas das empresas.

A situação é clara: hoje, muito do que se cria e pesquisa não chega ao cotidiano dos brasileiros devido à falta de ligação entre academia e setor empresarial. Inexiste no País um "meio-campista" que ligue a defesa ao ataque do time. Para preencher este espaço foram criadas as agências de inovação e incubadoras. Tais iniciativas, no entanto, não esgotam o potencial de empreendimentos que podem surgir da aproximação entre universidades e empresas para consolidar inovações. Existem pesquisas brasileiras de grande impacto que podem gerar novos benefícios à sociedade. São projetos que demandam mais do que transferência tecnológica, exigindo articulação entre empresas investidoras, pesquisadores e governo. O hiato está na prova das novas tecnologias em escala industrial, no seu teste prático, no scale-up, como se diz na indústria química. Hoje não há quem queira ser o primeiro a desempenhar esse papel ou que se disponha a financiar os altos investimentos necessários.

Experiências no mundo já mostram que a articulação de grandes projetos é cada vez mais um papel que cabe a institutos tecnológicos. As universidades e as empresas têm sido domínios distintos e distantes. Enquanto na universidade o trabalho é colaborativo e publicável, na empresa é competitivo e secreto; enquanto os resultados são de longo prazo no primeiro caso, em uma empresa precisam ser rápidos. São os institutos tecnológicos que, por já fornecerem serviços para a indústria e desenvolverem projetos em parceria com a academia, transitam entre as duas realidades, sendo assim um potencial aglutinador, um catalisador.

O Estado de São Paulo dá a partir deste ano exemplo concreto de como preencher a lacuna entre pesquisas e empresas. Com intermediação do Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo (IPT), ligado à Secretaria de Estado de Desenvolvimento, a cidade de São José dos Campos receberá o chamado Laboratório de Estruturas Leves (LEL), para pesquisa com materiais para aeronaves do futuro, atendendo também segmentos da indústria que igualmente demandam materiais de alto desempenho, como o naval, o automobilístico e de petróleo e gás. Já fecharam acordo: governo do Estado, BNDES, Embraer, Fapesp, Finep, FEI, ITA, USP, Unicamp, Unesp, Ipen e IAE, além da prefeitura. O investimento é de R$ 90,5 milhões.

Em Piracicaba, outro caso. O IPT, em parceria com o Centro de Tecnologia Canavieira, universidades e empresas, pretende iniciar planta-piloto para provar em maior escala os processos de gaseificação de biomassa. Trata-se de desafio enorme, já que a gaseificação pode representar um salto tecnológico para o setor energético ligado à cana de açúcar.

Além do IPT aqui no Brasil, que assume esta posição devido a forte incentivo do Governo do Estado, exemplo dessa articulação promovida por institutos tecnológicos é o CMI (The Cambridge-MIT Institute), que já trabalhou com 100 universidades e cerca de mil empresas e órgãos públicos em diferentes demandas de transferência de tecnologia com formação de recursos humanos.

O IPT já agrega ao seu currículo, a partir deste ano, o papel de articulador, estabelecendo assim as bases para sua atuação neste início de século. Resta agora consolidar esse modelo e esperar que o Brasil perceba que uma andorinha não faz verão, que o trabalho conjunto de universidades, institutos de pesquisas e empresas pode ser a maior oportunidade para avançar com mais velocidade no cenário mundial de inovações.

João Fernando Gomes de Oliveira, 50, graduado e doutorado em engenharia mecânica pela USP e pós-doutorado pela University of California - Berkeley, é diretor-presidente do Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo.