É lamentável que num momento em que se busca a conscientização quanto à necessidade de serem feitos maiores investimentos em Ciência e Tecnologia, como meio do País alcançar a tão almejada modernidade, um secretário de governo do maior estado da federação venha a público (Gazeta Mercantil, 21/03/96, p. A-5) para externar opiniões de cunho pessoal - aparentemente, em flagrante discordância de outros membros da equipe de Mário Covas, como, por exemplo, o Secretário de Ciência e Tecnologia, Emerson Kapaz - , que se constituem em verdadeiras "pérolas" do saber. Para Yoshiaki Nakano, Secretário da Fazenda, os três principais fatores que estrangulam São Paulo são "a incapacidade de fazer demissões no serviço público, o serviço da dívida (contratual e mobiliária) de R$ 52 bilhões, e as transferências obrigatórias às Universidades e a& Fundo de Amparo à Pesquisa (Fapesp), que atingiram R$ 1,7 bilhão em 1995". Mais adiante acrescenta que "suspender os repasses, previstos em lei estadual, de 9,57% da receita do ICMS (1,2% bilhão por mês) para as universidades estaduais, e de 1% para a Fapesp, implica um prolongado enfrentamento legal. Ele considera os repasses inconstitucionais, mas sabe que não será fácil fazer prevalecer a sua visão". Continuando em suas infelizes declarações, Nakano "considera ser profundamente injusto que o ICMS, um imposto regressivo em relação à renda, e que afeta mais os pobres, seja usado para financiar o estudo gratuito de estudantes em sua maioria de classe média".
As declarações acima foram prontamente contestadas, e diga-se de passagem de modo contundente, pelos três reitores das Universidades Estaduais Paulistas, em ofício encaminhado na mesma data ao Governador do Estado, pela forma como foi tratado um assunto da maior relevância.
Como posto em ofício enviado pelo Presidente do Conselho Superior da Fapesp, Francisco Romeu Landi, ao Secretário da Fazenda, em 25 de março, trata-se de visão simplista, que, conquanto compreensiva à luz da debilidade da saúde financeira do Estado, procura focalizar apenas e tão só os aspectos contábeis da questão, numa clara confusão entre custo e investimento. Palavras polidas, refletindo uma justa indignação, mas que permitem também ressaltar a total falta de preparo do preclaro contabilista na percepção dos graves problemas que afligem o País, em particular na área da Ciência e Educação.
Ato contínuo, seguiu-se a matéria do Presidente do Conselho Técnico Administrativo da Fapesp, Nelson de Jesus Parada, publicada na Gazeta Mercantil de 28 de março. Novamente discordância e o enorme desconforto pelo completo desconhecimento, por parte daquele secretário, do papel que a Fapesp, desde sua criação em 1960, vem desempenhando no desenvolvimento da pesquisa científica no Estado, e que a faz respeitada nacional e internacionalmente.
Apagado o incêndio, ficaram, as dúvidas, como não poderia deixar de ser em se tratando de um governo que fez da indecisão um de seus traços mais marcantes. Uma ação isolada, que encontra a sua justificativa nas limitações pessoais do personagem central. Ou ainda, embora não necessariamente excludente, uma ação orquestrada, tendo por meta final a completa desvinculação das receitas orçamentárias das Universidades Estaduais (e, na esteira, a da própria Fapesp, ainda que neste caso a missão seja consideravelmente mais difícil, uma vez que ela iria implicar mudança na Constituição Estadual) das receitas de arrecadação, que têm no ICMS a sua fonte principal. Como o episódio da LDO para 1996 ainda está muito presente na memória de todos, não há qualquer razão para tranqüilidade e, menos ainda; para rojões. Realisticamente, este é apenas mais um governo (e já se foram tantos outros, democráticos ou não) cujo compromisso com a Educação (e a infalível perna do binômio, Saúde) não tem ido além da retórica.
Celso de Barras Gomes é Ex-Diretor do Instituto de Geociências e atual Coordenador da Coordenadoria de Comunicação Social da USP, o membro do Conselho Superior da Fapesp.
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Jornal da USP