O mundo acaba de ganhar uma arma sofisticada contra a febre amarela e a dengue - doenças virais que, a cada ano, afetam mais de 50 milhões de pessoas, sobretudo em América Latina, África e Ásia. Um consórcio internacional de pesquisadores, que incluiu cientistas brasileiros, acaba de concluir o mapeamento genético do mosquito que propaga as doenças, o Aedes aegypti, fornecendo pistas importantes para o seu combate. O estudo foi publicado na Science.
A febre amarela é considerada, de maneira geral, mais grave que a dengue. Nas regiões tropicais do mundo, são registrados cerca de 200 mil casos por ano, dos quais 30 mil resultam em morte. Mas existe vacina contra a doença e, no caso do Brasil, as ocorrências vêm se reduzindo drasticamente nos últimos anos. Bastante conhecida dos moradores do Rio de Janeiro, onde costuma provocar epidemias, a dengue atinge 50 milhões de pessoas ao ano no mundo e, em sua forma mais grave, a hemorrágica, afeta 500 mil. Não há vacina contra a doença e, por isso, o mapeamento está sendo visto como uma arma especialmente importante contra a dengue.
"A idéia é que se possa encontrar ferramentas de combate ao mosquito mais específicas", afirmou o bioquímico e Acadêmico Sergio Verjovski Almeida, da Universidade de São Paulo (USP), coordenador da parte brasileira do estudo. "Os inseticidas usados hoje, por exemplo, são muito genéricos".
A grande maioria dos inseticidas atua em estruturas do sistema nervoso central dos insetos. Os produtos atualmente disponíveis no mercado, no entanto, agem sobre as moléculas comuns a praticamente todos os mosquitos. O conhecimento do genoma pode levar à identificação de moléculas exclusivas do aedes, o que, além de mais eficaz no extermínio, seria ambientalmente mais correto.
Os cientistas descobriram também que o aedes apresenta uma grande quantidade de moléculas relacionadas ao olfato, o que os levou a pensar que o mosquito teria boa parte de sua orientação calcada em receptores olfativos. "Pode se imaginar, por exemplo, interferir usando determinados tipos de cheiro", disse Almeida.
Alterar geneticamente o mosquito tornando-o incapaz de transmitir a doença, por exemplo, também é uma possibilidade que surge com o estudo. O mapeamento abre ainda outras linhas de pesquisa, não necessariamente relacionadas ao combate ao inseto. O aedes é um dos poucos mosquitos que transmitem vírus - outros morrem quando infectados - e ninguém sabe exatamente por que isso ocorre. O genoma, no entanto, revelou a presença acima da média de vírus atenuados no genoma do mosquito, o que pode ter garantido a ele a capacidade de ser imune a determinadas doenças e, dessa forma, se tornar um transmissor.
Os cientistas brasileiros trabalharam junto com especialistas do Instituto Pasteur no seqüenciamento do genoma da larva do mosquito. O custo foi de US$440 mil, divididos entre a instituição francesa e a Fapesp.
(Fonte: jornal O Globo, 18/5)