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Jornal do Brasil

Argentina propõe parceria nuclear

Publicado em 29 fevereiro 1996

Por TÂNIA MALHEIROS - Especial para o JB
A Argentina deverá propor ao Brasil uma parceria para a construção do reator de pesquisa Caren. Antigo projeto argentino, o Caren é um reator a água leve, de pequeno porte, que utilizaria urânio enriquecido como combustível (como Angra I). Técnicos do setor nuclear informaram que o Caren teria um dispositivo de segurança de última geração, capaz de interromper o funcionamento automaticamente em caso de pane. A proposta para a construção do Caren estaria incluída no acordo de cooperação nuclear que os dois países deverão assinar em março, quando o presidente Fernando Henrique Cardoso for à Argentina. A parceria para finalizar o projeto e iniciar a fabricação do Caren e, provavelmente, de outros reatores de pesquisa passa pelo crivo da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), com sede na Áustria. Experiência - Técnicos do setor acreditam que o governo brasileiro deverá aceitar a proposta de parceria para adquirir maior experiência na área de fabricação de reatores, na qual a Argentina tem know how bem maior. A Argentina participou ativamente da construção de suas usinas nucleares Atuchal e Embalse. Atucha 1 - em operação desde julho de 1974 - foi comprada da Alemanha e a Embalse - em funcionamento desde janeiro de 1984 - foi adquirida do Canadá. As duas usinas foram planejadas e erguidas com participação efetiva dos técnicos argentinos das mais diversas áreas. Atucha I sempre teve bom desempenho, exceto no período 1988-1989, quando precisou ser desligada por causa do rompimento de tubos de combustível. Embalse vem operando plenamente, ao contrário de Angra I, comprada pronta pelo Brasil da empresa americana Westinghouse, em 1970, e que entrou em operação 1S anos depois e que já foi desligada cerca de 30 vezes por defeitos. De acordo com os técnicos, outro exemplo de que os argentinos avançaram muito neste campo é o fato de a Argentina operar pelo menos seis reatores de pesquisas projetados e fabricados com tecnologia própria. Além disso, a Argentina já vendeu reatores de pesquisa para o Egito, Peru e Argélia e o núcleo de um reator, também de pesquisa, para o Irã. Maior intercâmbio de técnicos LEANDRO FORTES BRASÍLIA - Brasil e Argentina vão aumentar o intercâmbio de técnicos da área nuclear este ano e, assim, garantir, a curto prazo, o nivelamento tecnológico dos dois países no setor. Este foi o teor das conversas confidenciais às quais o ministro da Defesa da Argentina. Oscar Camillion, se referiu, na terça-feira passada, durante uma palestra no Senado Federal. O programa de transferência mútua de conhecimento nuclear foi iniciado pelo próprio Camillion, em 1980, quando ele era embaixador da Argentina no Brasil. Segundo Laércio Antônio Vinha, diretor de Relações Internacionais da Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen), Brasil e Argentina têm um grau de desenvolvimento muito semelhante na área de pesquisa e aplicação nuclear, mas há setores onde um acabou se desenvolvendo mais do que o outro. Por exemplo: o enriquecimento do urânio, embora tenha sido dominado mais tarde pelo Brasil, foi desenvolvido aqui através de técnicas mais modernas e, por isso, evoluiu mais rapidamente. A Argentina, por sua vez, está à frente na produção do zercaloy, um material usado no isolamento dos elementos combustíveis dos reatores nucleares. O relacionamento técnico-científico entre Brasil e Argentina envolve um intercâmbio de pessoal que, nos últimos anos, resultou em um programa de visitas e estágios de 60 técnicos dos dois países, numa troca aberta de conhecimento e experiências. Atem disso, desde 1991, através da Agência Brasileiro-Argentina de Controle e Contabilidade de Materiais Nucleares (Abac), os dois governos se fiscalizam de forma sistemática e institucional. A cooperação brasileiro-argentina inclui, ainda, a unificação dos sistemas de proteção e segurança nuclear, criando normas conjuntas de produção e transporte de material nuclear. "Com sistemas compatíveis, facilita-se a exportação e importação desses materiais entre os dois paises", explicou Laércio. Técnicos brasileiros e argentinos trabalham juntos também em pesquisas no campo de aplicação de técnicas nucleares na medicina, indústria, agricultura e proteção ao meio ambiente.