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Diarioweb (São José do Rio Preto)

Anvisa facilita liberação de medicamentos no Brasil

Publicado em 04 janeiro 2013

Por Cecília Dionizio

Quando um novo medicamento é lançado, muitas pessoas sequer imaginam o que está por trás disso. Até que chegue ao consumidor, existem inúmeras etapas a ser vencidas antes que sejam liberados para as prateleiras das farmácias.

Uma das principais é a pesquisa clínica, necessária a toda medicação que busca certificado de qualidade. Daí o fato de muitos profissionais da área de saúde comemorarem a resolução 196/96, versão 2012, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que aprovou a simplificação para que medicamentos já pesquisados em outras partes do mundo possam ser finalizadas por um processo menos complexo aqui no Brasil, antes de receberem a liberação para ser comercializados pela Anvisa.

Antes, era necessário que a pesquisa fosse refeita no Brasil e não havia a menor possibilidade do medicamento ser liberado sem que fossem realizadas todas as etapas da pesquisa no País novamente, o que implicava em anos de novos estudos. Agora, serão necessários apenas alguns ajustes para que não haja reações adversas e ele já poderá ser liberado.

Outra mudança importante da resolução é que ela reconhece a possibilidade de se remunerar as pessoas que estejam participando de alguma pesquisa. Algo que até então não era permitido pela legislação vigente no País, que, na prática, considerava o pagamento para participar de pesquisas algo ilegal. No exterior, o pagamento é feito há muitos anos, como forma de estimular as pessoas a entrar em protocolos de pesquisas.

Um acordo recente assinado entre a indústria farmacêutica GlaxoSmithKline Brasil (GSK), a Fundação de Apoio a Pesquisa (Fapesp) e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), de São Paulo, vai destinar R$ 3 milhões para áreas prioritárias para o desenvolvimento de pesquisas colaborativas que incluem temas como doenças respiratórias, metabólicas, infecciosas, inflamatórias e imunologia, além de doenças tropicais e negligenciadas e das chamadas doenças raras, que afetam um pequeno número de pessoas e cujas características são pouco conhecidas.

Assim como esta empresa, várias outras filiadas à Sociedade Brasileira de Profissionais em Pesquisas Clínicas (SBPPC) visam à proteção dos direitos das pessoas que se sujeitam às pesquisas. Segundo a pesquisadora Conceição Accenturi, presidente da entidade, esta é uma das grandes preocupações do Conselho Nacional de Saúde, por meio da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP).

O farmacologista Gilberto De Nucci, pesquisador da Universidade de Campinas (Unicamp), que possui várias produtos patenteados e também já desenvolveu diversos medicamentos com sucesso, dentre eles o chamado “viagra brasileiro”, montou ele próprio seu laboratório, onde remunera quem se dispõe a participar de suas pesquisas. Polêmico, De Nucci não mede palavras para reforçar a importância desta resolução finalmente ter sido aprovada no Brasil.

Diário da Região - Como o senhor vê a questão da remuneração para pessoas que se submetem às pesquisas clínicas?

Gilberto De Nucci - Participação em pesquisa envolve tempo, compromisso, entre outras coisas. Ou seja, se assemelha bastante a um contrato, portanto, considero justo que a pessoa seja remunerada.

Diário - O senhor remunera todos os seus voluntários? Desde quando e com que critério?

De Nucci - Sim, desde o primeiro estudo que realizei no Brasil, em 1989. O critério é baseado no tempo despendido pelo voluntário/paciente e em condições particulares da pesquisa, que pode envolver certo grau de desconforto. O valor é decidido conjuntamente com o Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos. Atualmente, creio que o valor esteja na faixa de R$ 200 a 300 reais por dia de internação.

Diário - Como as pessoas são selecionadas? Quando o procedimento foi regulamentado?

De Nucci - A seleção se dá baseada nos critérios de inclusão e exclusão de cada protocolo clínico. A primeira regulamentação oficial foi a Resolução 01/88, elaborada pelo professor doutor Elisaldo Carlini, renomado pesquisador da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).

Diário - Como é feito hoje, e quem pode se beneficiar com a mudança?

De Nucci - Hoje é feito por meio dos Comitês de Ética em Pesquisa em Seres Humanos, devidamente credenciados pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP). Importante ressaltar que na Resolução da CONEP de 1996 era permitido o ressarcimento do tempo e das despesas do sujeito de pesquisa (o que na verdade era um eufemismo para pagamento).

Diário- A remuneração de alguma forma melhora a qualidade da pesquisa produzida? Por quê?

De Nucci - Defendo há décadas que o pagamento deve ser feito a todos os sujeitos de pesquisa, independente de serem voluntários sadios ou pacientes. Considero isso ético e melhora sensivelmente a qualidade das informações obtidas, assim como a torna mais transparente.

Diário - Por que, na sua opinião, sempre houve tanta resistência no Brasil à remuneração dos voluntários de pesquisa?

De Nucci - Segundo Bacon (Francis Bacon, filósofo inglês, considerado o fundador da ciência moderna), a sociedade reage em três etapas ao conhecimento novo trazido pelo cientista. Negação com ódio (eu particularmente quase fui preso por pagar abertamente sujeitos de pesquisa no Brasil), negação (a fase que estávamos passando, pagando através do eufemismo do ressarcimento) e finalmente aceitação (onde chegamos agora).