Um time internacional de pesquisadores realizou o mais completo mapeamento dos efeitos previstos sobre os anfíbios anuros (sapos, rãs e pererecas) da combinação entre mais secas e o aquecimento do planeta. O estudo foi publicado na revista Nature Climate Change.
Amazônia e Mata Atlântica são as áreas que têm mais espécies e a maior probabilidade de os eventos de seca aumentarem, tanto na frequência quanto na intensidade ou duração. Isso deve prejudicar a fisiologia e o comportamento de inúmeras espécies. Esses biomas estão entre as regiões do planeta com maior diversidade de anfíbios do mundo, com muitas espécies que só ocorrem nessas localidades. O pesquisador Rafael Bovo, da Universidade da Califórnia, em Riverside, nos Estados Unidos , e um dos autores do estudo, destacou esses pontos.
A maior parte dos dados, inéditos para a ciência até então, foi coletada por Bovo durante o doutorado no Instituto de Biociências da Universidade Estadual Paulista (IB-Unesp), em Rio Claro, e o pós-doutorado no Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (IB-USP), ambos com bolsa da FAPESP.
O trabalho integra o projeto “Impactos das mudanças climáticas e ambientais sobre a fauna: uma abordagem integrativa”, apoiado pela FAPESP e coordenado por Carlos Navas, professor do IB-USP que também assina o estudo.
As previsões indicam que entre 6,6% e 33,6% dos hábitats dos anuros se tornarão mais áridos entre 2080 e 2100, a depender das emissões de gases de efeito estufa até lá. Num cenário moderado de emissões, em que as temperaturas aumentariam em 2 ºC, 15,4% desses locais estariam expostos a mais secas. Caso as emissões no fim do século cheguem a um nível alto, com aquecimento de até 4 ºC, mais de um terço (36%) desses hábitats serão submetidos a secas que podem ser devastadoras para os anfíbios anuros.
Na prática, num futuro 4 ºC mais quente, os anfíbios da Amazônia, América Central, Chile , norte dos Estados Unidos e Mediterrâneo europeu devem vivenciar um aumento de mais de quatro meses por ano na frequência de secas. Mesmo um aquecimento de 2 ºC, porém, deve aumentar a duração das secas entre um e quatro meses consecutivos por ano na maior parte das Américas, Europa , sul e centro da África e sul da Austrália.
Os pesquisadores constataram que algumas regiões áridas podem até dobrar as taxas de perda de água pelos sapos, rãs e pererecas. Assim como a combinação de seca e aquecimento pode dobrar também a redução do tempo de atividade desses animais, comparando com o que se espera apenas com o impacto do aquecimento sozinho.
Simulações biofísicas realizadas pelos pesquisadores apontaram que na parte tropical do planeta, que inclui Amazônia e parte da Mata Atlântica, o tempo de atividade se reduz em todos os cenários climáticos ao longo do ano.
Além das informações coletadas em campo e laboratório por Bovo, outra parte dos dados foi reunida e padronizada a partir da literatura científica existente. O processo durou cerca de três anos. Os pesquisadores agora trabalham para entender se algumas espécies têm plasticidade suficiente para se ajustar a ambientes mais áridos num curto prazo, ou mesmo se são capazes de se adaptar na escala evolutiva, ao longo de milhares de anos.
O artigo Global exposure risk of frogs to increasing environmental dryness pode ser lido em: https://www.nature.com/articles/s41558-024-02167-z.
Informações da Agência FAPESP