A Floresta Amazônica pode entrar em colapso irreversível até 2050, segundo um estudo liderado por pesquisadores brasileiros e publicado na revista Nature nesta quarta-feira (14). A pesquisa ganhou destaque como capa da publicação e ressalta o “estresse climático” da floresta.
De acordo com os pesquisadores, 10% a 47% da floresta podem entrar em seu ponto de não retorno nos próximos 25 anos . Este estado significa que a destruição da Amazônia atinge um nível tão intenso que se torna impossível retornar ao seu estado original , se tornando outro tipo de vegetação.
“Nosso estudo mostra que, por causa desses distúrbios sobrepostos , parcela de até 47% da Amazônia pode sofrer uma mudança abrupta. A floresta tropical entra num processo de transição para um estado de crescimento diferente”, afirma à DW Bernardo Flores, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), primeiro autor do estudo.
A pesquisa analisou os distúrbios aquecimento global , volume de chuvas anuais, intensidade da sazonalidade das chuvas, duração da estação seca e desmatamento . Mesmo que esses fatores atinjam 10% da floresta existente, o cenário futuro se mostra como devastador
"Se somarmos isso aos 15% de vegetação nativa que já foi perdido, chegaríamos a um total de 25% de destruição . Ou seja, ultrapassaríamos a cota estimada lá atrás pelos estudos de Carlos Nobre, que previa que o ponto de não retorno seria alcançado com 20% de manipulação da Amazônia ”, explica Flores.
O impacto da destruição vai além da perda de biodiversidade. Na Amazônia, vivem cerca de 25 milhões de pessoas , que dependem da floresta como meio de sobrevivência. Entre essas pessoas estão indígenas, ribeirinhos e quilombolas . O colapso significa, para esses grupos, a destruição de seus meios de subsistência, modos de vida e conhecimentos tradicionais
Estresse hídrico
A Floresta Amazônica também é responsável pelo ciclo e volume das chuvas. Os chamados “rios voadores ” abastecem diversos estados e regiões importantes economicamente para o país.
Com a perda de vegetação, perde-se também a capacidade de produzir chuva que, por sua vez, causa ainda mais perda de floresta, além de seca e estresse hídrico. "A floresta produz chuva, e a chuva mantém a floresta resiliente. Se você enfraquecer esse feedback , ou círculo virtuoso, a floresta fica menos resiliente a outros distúrbios e com mais chance de morrer , ou de mudar. É como se ela se reorganizasse rumo ao colapso”, afirma Flores.
Para os pesquisadores, a floresta sofre uma "pressão sem precedentes" devido às mudanças climáticas, que se intensificam a cada ano. O mês de janeiro de 2024 foi considerado o mais quente já registrado. A temperatura média global dos últimos 12 meses (fevereiro de 2023 a janeiro de 2024) é a mais alta já registrada, 1,52ºC acima da média pré-industrial.
O aquecimento global é o principal fator que contribui para o colapso da floresta. O fenômeno gera fatores determinantes para esse estresse hídrico, como o aumento da temperatura média global acima de 1,5º C, volume de chuvas abaixo de 1.800 mm, duração da estação seca superior a cinco meses e desmatamento superior a 10% da cobertura original da floresta.
Ponto de não retorno
Natália Nascimento, única integrante da pesquisa que é da Amazônia, afirmou que uma inovação do estudo é que ele é capaz de identificar quais áreas podem sofrer o ponto de não retorno . Essas áreas estão localizadas no norte do Mato Grosso e em Rondônia e na região central do estado do Amazonas. “O pior de tudo é que essa região está no arco do desmatamento , onde a situação é mais grave porque a floresta é mais sensível por, há décadas, ser forçado no limite”, disse à DW.
Combate ao desmatamento
O combate ao desmatamento continua sendo a principal forma de interromper o ponto de não retorno. Os especialistas reforçam a importância de ações integradas em níveis locais, além de ações globais para reduzir as emissões de gases do efeito estufa
"Em alguns casos, a floresta pode se recuperar, mas permanece presa em estado degradado, dominada por plantas oportunistas, como cipós ou bambus. Em outros casos, a floresta não se recupera mais e persiste presa em estado de vegetação aberta e com incêndios recorrentes", explica Flores.
Sobre o estudo
A pesquisa foi liderada por pesquisadores brasileiros durante três anos. O financiamento foi pelo Instituto Serrapilheira com esforços do Science Panel For The Amazon . O instituto é uma organização sem fins lucrativos que promove a produção científica no Brasil. Ao todo, foram 24 autores, sendo 14 brasileiros.