Em artigo publicado na "Nature" e liderado por brasileiros, pesquisadores identificam os principais fatores de estresse que podem atingir a floresta e apontam possíveis consequências
A Floresta Amazônica se manteve relativamente resiliente às variações climáticas por cerca de 65 milhões de anos. Nas últimas décadas, porém, a região vem enfrentando cada vez mais estresse com elevação das temperaturas, secas extremas, desmatamento e incêndios florestais. Diante desse cenário sem precedentes, a Amazônia pode atingir um ponto de não retorno até 2050, levando ao colapso parcial ou total do ecossistema.
O alerta consta em um estudo publicado nesta quarta-feira (14) na revista Nature, baseado na revisão de artigos e em modelagens estatísticas. O trabalho foi liderado por brasileiros e financiado pelo Instituto Serrapilheira, contando também com a participação de pesquisadores da Europa e dos Estados Unidos.
“O ponto de não retorno é um ponto a partir do qual o sistema se retroalimenta numa aceleração de perda de florestas e perdemos o controle”, explica, em comunicado enviado à imprensa, o biólogo e ecologista Bernardo Flores, pesquisador da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) que coliderou o estudo ao lado de Marina Hirota, da mesma instituição.
De acordo com a investigação, até 2050, entre 10% e 47% da Floresta Amazônica estará exposta a ameaças graves, capazes de desencadear transições ecossistêmicas. O estudo identifica os fatores de estresse mais relevantes, estimando os limites críticos para cada um deles: aumento na temperatura média global acima de 1,5ºC, volume de chuvas abaixo de 1.800 milímetros, duração da estação seca superior a cinco meses e desmatamento superior a 10% da cobertura original da floresta, somado à falta de restauração de pelo menos 5% do bioma.
“Estamos nos aproximando de todos os limiares. No ritmo em que estamos, todos serão alcançados neste século”, adverte Flores.
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Ultrapassar esses limites aumenta o risco de colapso total ou parcial do ecossistema. “Em alguns casos, a floresta pode se recuperar, mas permanece presa em estado degradado, dominada por plantas oportunistas, como cipós ou bambus. Em outros casos, a floresta não se recupera mais e persiste presa em estado de vegetação aberta e com incêndios recorrentes", comenta o pesquisador.
A perda florestal significa também uma maior emissão de carbono e uma redução na circulação da umidade atmosférica. As consequências de atingir um ponto de não retorno, portanto, incluem a aceleração do aquecimento global e a mudança no regime de chuvas – não só em áreas próximas da Amazônia, mas em regiões distantes como Ásia e Antártida.
“Nós discutimos como a complexidade inerente da Amazônia adiciona uma incerteza quanto às dinâmicas futuras, mas também revela oportunidades para ação”, escrevem os pesquisadores no artigo.
Os cientistas destacam ainda que preservar a resiliência da Floresta Amazônica depende de esforços locais e globais. Ao Brasil cabe zerar o desmatamento e a degradação, investindo na restauração das áreas perdidas. Já a nível internacional, é necessário interromper a emissão de gases do efeito estufa.