Dia após dia, o Brasil vem comemorando nos últimos anos recordes sucessivos na expostação de produtos agropecuários. Nos transformamos nos maiores exportadores de café, soja e carne bovina, somos o segundo maior exportador de frango e camarão e ocupamos lugar de destaque na produção de algodão, milho e frutas. Graças a esse esforço exportador, o Brasil começou a produzir superávits comerciais que desequilibraram a balança comercial a nosso favor. A expectativa é que neste ano de 2004 o Brasil venda U$ 20 bilhões a mais do que vai comprar.
Mas, como sempre no Brasil, poucos se lembram porque alguma coisa começa a dar certo -ou a dar errado. Parece que tudo acontece por geração espontânea, de um dia para o outro. Como se na economia e nos negócios as coisas funcionassem como no futebol -só para usar uma das metáforas tão caras ao nosso atual presidente da República. Na economia e nos negócios não basta trocar o técnico e contratar dois ou três craques para que o time passe a colecionar vitórias. Um ramo econômico só cresce com planejamento, organização e visão de longo prazo.
O agronegócio brasileiro só está batendo recordes de produção e exportação porque algumas medidas fundamentais foram tomadas dez anos atrás. Em primeiro lugar, foi feita a securitização das dívidas dos agricultores com os bancos. Todos aqueles que estavam endividados e com os bens penhorados puderam renegociar e alongar suas dívidas, a maioria com o Banco do Brasil. Com isso, os agricultores voltaram a ter crédito, puderam pegar empréstimos no banco e retomaram com força aquilo que mais sabem fazer.
Em segundo lugar, foram abertas linhas de crédito com taxas de juros baixas e fixas, que iam de 4% ao ano no Pronaf (Programa Nacional de Agricultura Familiar) a 8,5% ao ano nos programas tradicionais de crédito rural. Simultaneamente, o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) criou programas de financiamento da compras de máquinas agrícolas (Modenmaq) e de construção de infraestrutura de armazéns e silos (Modeninfra).
Em terceiro lugar, estabeleceu-se uma carga tributária menor e diferenciada, com alíquotas de 0%, para produtos de exportação, a 7%, para máquinas, insumos e implementos agrícolas.
Em quarto lugar, o campo passou a absorver os resultados das pesquisas desenvolvidas pela Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), pela Fapesp (Fundação de Pesquisas do Estado de São Paulo) e de outros institutos. A aplicação dessas pesquisas, nas áreas de inseminação artificial, de desenvolvimento de sementes e de outros insumos significou um salto tecnológico que colocou o Brasil à frente de inúmeros países de primeiro mundo, que gastam quase U$ 1 bilhão por dia para subsidiar seus produtos agropecuários. Em São Paulo, por exemplo, a Assembléia Legislativa aprovou a criação da APTA (Agência Paulista de Tecnologia do Agronegócio), que agrupou os seis institutos de pesquisa ligados a Secretaria da Agricultura.
Na pecuária foram sendo tomadas medidas que garantiram ainda mais a qualidade do rebanho brasileiro. O Brasil, depois de anos e anos de campanhas de vacinação, foi declarado zona livre da febre aftosa. Ao mesmo tempo, países da Europa se defrontaram com o flagelo do mal da vaca louca. Quando isso aconteceu, o rebanho brasileiro acabava de ultrapassar a Austrália em número de cabeças e estava pronto para se tornar o mais qualificado para a exportação.
Outras medidas, como a desvalorização cambial, é claro, contribuíram para aplainar ainda mais esse nosso caminho exportador. Mas, se não fossem as medidas tomadas dez anos atrás, durante o governo Fernando Henrique Cardoso, não haveria mercadoria para entregar por mais abertos que estivessem os mercados internacionais ou por mais desvalorizado que fosse o Real. O mérito dessa herança precisa ser creditado a quem é de direito.
Agora, é o caso de se perguntar: por que medidas semelhantes não são tomadas para estimular o desenvolvimento de setores industriais urbanos? É preciso criar linhas de crédito com juros baratos e fixos para os pequenos e médios industriais. A eles deve ser dado um tratamento tributário diferenciado para que possam aplicar mais recursos na expansão da produção e na busca de novos mercados. Nesse sentido, já tramita em Brasília o projeto que regulamenta o Super Simples para os pequenos e médios empresários. A aplicação desse projeto, idealizado pelo PSDB de São Paulo, poderá tirar da informalidade uma série de empreendedores que sobrevivem à margem das leis fiscais.
O governo do Estado de São Paulo já deu alguns exemplos de como a redução e a simplificação da carga tributária pode ser benéfica para a economia. A redução do ICMS sobre o álcool, produtos têxteis e de artefatos de couro, ao invés de diminuir, provocou o aumento da arrecadação do imposto sobre esses setores. Também foi aprovado pela Assembléia Legislativa de São Paulo a criação e a ampliação do Simples Paulista, que beneficiou mais de 500 mil micro e pequenas empresas que ficaram isentas ou tiveram redução do ICMS.
E é justamente isso que falta ao Brasil: um projeto para alavancar as pequenas e médias empresas para fazer com que o País se torne uma potência também na área de produtos manufaturados. Mas, mais do que isso, um projeto desse porte poderá dar emprego e promover a inclusão social de milhares de marginalizados nos grandes centros urbanos.
*Sidney Beraldo, 53 anos, é empresário do ramo têxtil, deputado pelo PSDB e presidente da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo
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O Imparcial (Presidente Prudente, SP)