O pinhão-manso, planta utilizada no Brasil como cerca-viva e que possui um alto teor de óleo em suas sementes, tem sido objeto de estudos de pesquisadores do Pólo Centro-Sul da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (Apta), em Piracicaba, que acreditam no potencial do fruto como alternativa para a produção de biodiesel.
O objetivo inicial da pesquisa, é levantar a variabilidade genética da planta, mas o estudo requer apoio governamental e empresarial. Os experimentos de laboratório já começaram, com recursos dos próprios pesquisadores e apoio logístico das instituições representadas por eles.
Com a obrigatoriedade da mistura B2 - adição de 2% de biodiesel ao óleo diesel -, será crescente a demanda por oleaginosas no Brasil. Atualmente, 55% da produção do biodiesel nacional é feita a partir do óleo da soja, que tem processo produtivo bem desenvolvido e dominado pela indústria. Apesar disso, o grão fornece apenas 18% de óleo, mas ganha em valor por ser também destinado à alimentação. "É preciso fazer um mapeamento das culturas de oleaginosas para que fiquem mais produtivas em determinadas regiões e possam atender a essa demanda por mistura. O pinhão-manso não é comestível, mas pode ser totalmente utilizado para diesel", disse a engenheira agrônoma Daniela de Argollo Marques, uma das coordenadoras do programa Pinhão Manso (Jatropha curcas) e responsável pelo laboratório de ferramentas biotecnológicas do projeto.
A equipe multidisciplinar que integra o projeto e tem ainda a coordenação dos pesquisadores Alceu de Arruda Veiga Filho, Raffaella Rossetto e Maria Regina Ungaro, conta com a participação de técnicos da fazenda Santa Elisa do Instituto Agronômico de Campinas (IAC), Instituto Biológico de São Paulo, da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, com apoio logístico da Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (Cati) e do Instituto de Terras do Estado de São Paulo (Itesp).
Segundo Daniela, o Brasil conta com pelo menos 40 plantas oleaginosas que poderiam ser utilizadas na produção do biodiesel. O pinhão-manso é uma das possibilidades e por isso foi incluído no Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel (PNPB), do Governo Federal, como matéria-prima promissora para a fabricação de combustível.
O alto teor de óleo das sementes do pinhão-manso, entre 30% e 50% de acordo com o material genético, é uma das vantagens apontadas pelo projeto. Trata-se de um óleo com características físico-químicas pertinentes - índice de iodo, proporção de ácido oleico e olinoleico - capazes de proporcionar um desempenho mais completo ao combustível no motor. Por ser um óleo de baixa viscosidade, também pode contribuir para melhorar a qualidade do biodiesel.
Outro fator é que a planta é perene, seu ciclo produtivo se estende por cerca de 40 anos, o que reduz o custo da produção. É de fácil manejo e sua colheita ainda é manual - à base da "sacudida" -, já que a planta chega a medir 1,5 metro.
Os benefícios da planta se estendem ainda às vantagens sociais, segundo os estudiosos. "Por ter colheita manual, é indicada e se adapta bem às diretrizes dos programas de incentivo à agricultura familiar, além de contribuir para a fixação do homem no campo e para a inclusão social do trabalhador rural", ressaltou a pesquisadora científica.
Conhecimento
Embora ainda haja pouco conhecimento técnico-científico sobre o pinhão-manso, seu estudo não é novidade. O interesse teve início na década de 80, mas a pesquisa foi paralisada por causa do petróleo, que voltou a ter preço competitivo e seu uso foi retomado.
A pesquisa realizada na Apta leva em conta que, embora o pinhão-manso não seja domesticado, não há estabilidade em seu cultivar e nem uniformidade permanente para o desenvolvimento de tecnologias de manejo para aproveitamento em sua totalidade. Por isso, investimentos para conhecê-la cientificamente garantirão uma alternativa tecnológica para o futuro, como aconteceu com as culturas da soja e da cana, amplamente utilizadas hoje.
No ponto inicial do levantamento, está a criação e manutenção de um banco de germoplasmas, formado por diferentes tipos de pinhão-manso de várias regiões brasileiras e espécies de outros países, como o pinhão bravo e o pinhão roxo. "Queremos verificar diversas espécies para explorar a variedade genética da planta, que darão suporte ao programa de melhoramento genético, visando a seleção de plantas com alto teor e qualidade do óleo, alta produtividade, maturação uniforme dos frutos, altura reduzida do vegetal, resistência a pragas e doenças e baixo teor de princípio ativo tóxico", salienta Daniela.
Diferente do pinhão-manso mexicano, isento de toxina, o nacional tem princípios ativos tóxicos que impedem, entre outras coisas, que seja utilizado como ração animal. Se os estudiosos conseguirem diminuir a toxicidade da planta selvagem, será possível extrair 8% a mais do óleo que sobra no resíduo (torta) da planta macerada. Essa torta é rica em proteína e, estando livre de toxinas, pode ser transformada em ração animal, o que exigiria aumento da produção e reduziria custos totais. O farelo dessa torta também é rico em nitrogênio, potássio e fósforo e poderia ser utilizado como adubo na própria cultura do pinhão, diminuindo mais uma vez os custos de produção.
Por causa do programa de melhoramento, que se utiliza da biotecnologia (clonagem), e por se tratar de uma planta perene, os pesquisadores acreditam ser possível reduzir de 12 para quatro anos o tempo de cultivo do pinhão. O sistema de tecnologia de manejo também será objeto da abordagem, com experimentos em fitotecnia, adubação, avaliação das principais pragas e doenças.
Ao final, esse protocolo será encaminhado para órgãos como a Cati, que adaptam os resultados para uso de produtores rurais. "Os resultados irão orientar na condução de campos de produção de pinhão-manso, contribuindo para a implantação dessa cultura em escala comercial", falou a agrônoma.
Apoio
O programa Pinhão Manso está pleiteando apoio financeiro da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) e do setor privado. Uma das empresas que já firmou compromisso com a Apta é a Biocapital, de Charqueada, que atua na extração de gordura animal. "A tecnologia gerada pelo programa será essencial para que a cultura do pinhão-manso seja incorporada definitivamente ao segmento de agronegócios paulista voltado à produção de bioenergéticos", destaca Daniela Argollo.