A agricultura mundial deveria evitar os extremos em termos de uso de fertilizantes sintéticos: deixar de recorrer à adubação excessiva, prática adotada por muitos países desenvolvidos nas últimas décadas, mas, ao mesmo, desestimular a situação que ainda predomina em algumas áreas extremanamente pobres do globo, onde quase não se utiliza fertilizante algum. O ideal é adicionar às culturas agrícolas uma quantidade apenas moderada de nutrientes.
Essa é a recomendação de um estudo internacional, feito por biológos e engenheiros agrônomos de vários países, inclusive o Brasil, publicado na revista científica norte-americana Science, na edição do último dia 19.
"A maioria dos sistemas agrícolas segue uma trajetória que migra da adição de nutrientes numa quantidade muito pequena para uma em que a quantidade é excessiva - e ambos os extremos acarretam custos substanciais para o homem e o meio ambiente", diz o biólgo Peter Vitousek, da Universidade Stanford, um dos autores do trabalho.
"Algumas partes do mundo, incluindo a China, usa fertilizantes em excesso. Mas, na África sub-saariana, onde 250 milhões de pessoas permanecem cronicamente malnutridas, a adição de nitrogênio, fósforo e outros nutrientes são inadequados para manter a fertilidade do solo."
Para chegar às suas conclusões, os pesquisadores analisaram o uso de fertilizantes nitrogenados em plantações de milho em três lugares distintos do globo: norte da China, oeste do Quênia e meio-oeste dos Estado Unidos.
Em termos de excesso, a situação hoje é particularmente preocupante no gigante asiático. Os fertilizantes são subsidiados por Pequim e, entre 1977 e 2005, seu uso aumentou 271% na China, embora o ganho de produtiviade da agricultura tenha sido de 98%. O resultado dessa política de adubação exacerbada é conhecido: contaminação por nitrogênio das águas, inclusive as subterrâneas, dando origem a "zonas mortas" em áreas costeiras, como o Golfo do México, e mais poluição do ar em razão da amônia advinda das culturas adubadas.
"As plantas só aproveitam no máximo 40% dos nutrientes que aportamos à lavoura", comenta Luiz Antonio Martinelli, do Centro de Energia Nuclear na Agricultura (Cena) da Universidade de São Paulo (USP) em Piracicaba, um dos autores do artigo. "Os outros 60% vão para o ambiente independentemente da quantidade de adubo usada. Por isso, temos de usar o mínimo possível de fertilizantes."
Os Estados Unidos e a Europa também já se excederam no emprego de fertilizantes, sobretudo entre 1970 e meados da década passada. Mas hoje a situação é mais próxima do razoável, dizem os pesquisadores. A produtividade do cultivo do milho no meio-oeste dos Estados Unidos é igual à da China, mas os americanos usam uma quantidade seis vezes menor de fertilizante nitrogenado e geram 23 vezes menos nitrogênio em excesso. Diante desse quadro, os pesquisadores acreditam que Pequim poderia reduzir à metade o emprego de adubo sintético na agricultura sem ter qualquer perda de rendimento ou de qualidade do grão de milho.
O caso do Quênia é exatamente o oposto do que ocorre na China. Ali os agriculturos africanos empregam pouco mais de 1% da quantidade de fertilizantes sintéticos que os chineses usam na lavoura de milho. De acordo com o estudo, os quenianos adicionam anualmente 7 quilos de nitrogênio por hectare em suas plantações, muito menos nutriente do que o cultivo desse grão retira do solo (52 quilos de nitrogênio por hectare). Ou seja, a quantidade de adubo usada é totalmente insuficiente para garantir a produtividade da terra.
Brasil
Segundo Martinelli, o Brasil, cujas lavouras de milho não foram alvo do artigo da Science, está numa posição razoavelmente boa no que diz respeito à contaminação do meio ambiente por meio de fertilizantes sintéticos. O adubo aqui é caro e não costuma ser empregado de forma extensiva na agricultura.
"Em áreas do Nordeste, a situação está mais próxima da África do que da China. Ali faltam nutrientes para manter o solo produtivo", diz Martinelli. "Nas lavouras nacionais que mais usam fertilizantes nitrogenados, como o café e a laranja, a quantidade de nitrogênio adicionado por hectare é menor do que a média da Holanda".
FONTE: Pesquisa Fapesp