Notícia

Gazeta do Povo

Adubar na medida certa

Publicado em 11 julho 2009

Estudo de pesquisadores de vários países condena tanto o excesso como a falta de fertilizantes sintéticos na produção agrícola

 

Os fertilizantes sintéticos aumentaram consideravelmente a produção de alimentos no mundo, mas os danos ao meio ambiente e à saúde humana foram substanciais. O excesso de nitrogênio nas plantações contaminou grandes quantidades de terra e de água subterrânea e ajudou a criar as chamadas “zonas mortas”, como ocorreu no Golfo do México. E a amônia das áreas fertilizadas transformou-se em uma das principais fontes de poluição do ar.

Um estudo concluído recentemente por biológos e engenheiros agrônomos de vários países, entre eles o brasileiro Luiz Martinelli, da Universidade de São Paulo (USP), concluiu que a agricultura mundial deveria evitar os extremos em termos de uso de fertilizantes sintéticos: de um lado, deixar de recorrer à adubação excessiva, prática adotada por muitos países desenvolvidos nas últimas décadas, e de outro, estimular o uso de fertilizantes em algumas áreas extremamente pobres do globo, onde quase não se utiliza adubos. O ideal, de acordo com o estudo, é adicionar às culturas agrícolas uma quantidade apenas moderada de nutrientes.

“A maioria dos sistemas agrícolas segue uma trajetória que migra da adição de nutrientes numa quantidade muito pequena para uma em que a quantidade é excessiva – e ambos os extremos acarretam custos substanciais para o homem e o meio ambiente”, diz o biólogo Peter Vitousek, da Universidade Stanford, um dos autores do trabalho. “Algumas partes do mundo, incluindo a China, usa fertilizantes em excesso. Mas, na África sub-saariana, onde 250 milhões de pessoas permanecem cronicamente malnutridas, a adição de nitrogênio, fósforo e outros nutrientes são inadequados para manter a fertilidade do solo”, acrescenta.

Os pesquisadores chegaram a tais conclusões após analisarem o uso de fertilizantes nitrogenados em plantações de milho em três lugares distintos do globo: norte da China, oeste do Quênia e meio-oeste dos Estados Unidos.

Em termos de excesso, a situação hoje é particularmente preocupante no gigante asiático. Os fertilizantes são subsidiados por Pequim e, entre 1977 e 2005, seu uso aumentou 271% na China, embora o ganho de produtividade da agricultura tenha sido de 98%.

“As plantas só aproveitam no máximo 40% dos nutrientes que aportamos à lavoura”, comenta Luiz Antonio Martinelli, que trabalha no Centro de Energia Nuclear na Agricultura (Cena) da USP), em Piracicaba. “Os outros 60% vão para o ambiente independentemente da quantidade de adubo usada. Por isso temos de usar o mínimo possível de fertilizantes”, pondera.

Outros países que excederam o emprego de fertilizantes são os Estados Unidos e a Europa, principalmente no período entre 1970 e meados da década passada. Mas hoje a situação é mais próxima do razoável, dizem os pesquisadores. A produtividade do cultivo do milho no meio-oeste dos Estados Unidos é igual à da China, mas os americanos usam uma quantidade seis vezes menor de fertilizante nitrogenado e geram 23 vezes menos nitrogênio em excesso. Diante desse quadro, os pesquisadores acreditam que Pequim poderia reduzir à metade o emprego de adubo sintético na agricultura sem ter qualquer perda de rendimento ou de qualidade do grão de milho.

Insuficiência

Mas o outro extremo também preocupa. Um exemplo do baixo uso de adubos é o Quênia. No país africano, os agricultores empregam pouco mais de 1% da quantidade de fertilizantes sintéticos que os chineses usam na lavoura de milho. De acordo com Pedro Sánchez, diretor de agricultura tropical do Instituto da Terra da Universidade de Columbia e co-autor do estudo, os quenianos adicionam anualmente 7 quilos de nitrogênio por hectare em suas plantações, muito menos nutriente do que o cultivo desse grão retira do solo (52 quilos de nitrogênio por hectare). Ou seja, a quantidade de adubo usada no Quênia é totalmente insuficiente para garantir a produtividade da terra. Os pesquisadores alertam, no entanto, que é importante para a África não repetir os excessos registrados nos Estados Unidos e na China.

Segundo Martinelli, o Brasil, cujas lavouras de milho não foram alvo do artigo publicado na revista Science e no site da revista da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), está numa posição razoavelmente boa no que diz respeito à contaminação do meio ambiente por meio de fertilizantes sintéticos. O adubo aqui é caro e não costuma ser muito empregado na agricultura. “Em áreas do Nordeste, a situação está mais próxima da África do que da China. Ali faltam nutrientes para manter o solo produtivo”, diz Martinelli. “Nas lavouras nacionais que mais usam fertilizantes nitrogenados, como o café e a laranja, a quantidade de nitrogênio adicionado por hectare é menor do que a média da Holanda”.