Imaginar como será a Universidade ao final da gestão reitoral a ser eleita nas próximas semanas foi uma das questões propostas aos candidatos em debate na sede do grupo O Estado de S. Paulo
Uma intensa agenda de debates tem marcado o processo de eleição para a Reitoria da USP. No dia 6 de outubro, os oito candidatos foram recebidos na sede do grupo O Estado de S. Paulo. No dia 8, houve dois debates: um no Instituto de Estudos Avançados (IEA) e outro promovido pelo Jornal do Campus, publicação-laboratório dos alunos de Jornalismo da Escola de Comunicações e Artes da USP, realizado na Escola Politécnica.
No dia 13, foi a vez de um encontro promovido pela Associação de Docentes da USP, no auditório do Instituto Oceanográfico. O jornal Folha de S. Paulo recebeu os candidatos, divididos em grupos de quatro, nos dias 14 e 15. Também no dia 15 houve debate na Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP. Nesta página, o Jornal da USP apresenta uma síntese das discussões do encontro sediado no grupo Estado. Na página seguinte, aborda o tema "A USP e a sociedade", proposto pelo IEA no dia 8.
Armando Corbani Ferraz (pró-reitor de Pós-Graduação)
Um dos pontos fundamentais é ampliar as discussões na Universidade. É preciso que tanto os estudantes quanto os docentes se integrem mais nos colegiados. O engajamento de todos é fundamental. O debate deve ser permanente, e não existir só em época de sucessão. Devemos trazer os grandes temas nacionais para a Universidade para que ela dê sua contribuição às discussões das questões importantes de São Paulo e do Brasil. Temos cerca de R$ 120 milhões por ano para investimento e mais ou menos R$ 500 milhões, especialmente para pesquisa, incorporados pelos órgãos de fomento e iniciativa privada. Todo recurso que puder ser captado pela Universidade será bastante importante. Temos que trabalhar entre as três universidades públicas estaduais para formalizar o repasse de recursos para elas na Constituição do Estado, assim como ocorre com a Fapesp.
Francisco Miraglia (professor titular do Instituto de Matemática e Estatística)
O Estatuto da USP, em sua essência, ainda é o imposto pela ditadura militar. É anacrônico e profundamente antidemocrático. É essencial democratizar as relações na USP. Vamos construir uma estatuinte que se dissolverá assim que terminar seu trabalho, para separar quem institui o poder de quem o exerce. Acredito que será um processo de humanização profundo do tecido social da Universidade. A voz dos alunos, professores e funcionários deve se manifestar cotidianamente nas decisões da USP. Eles devem ser os sujeitos da história e do futuro da instituição. É preciso inserir a USP de forma clara na discussão de políticas públicas de saúde, transporte, educação, reforma tributária etc. O tributo que sustenta a USP é indireto e não distributivo. Ou seja, paga mais quem tem renda menor. É preciso dar aos estudantes os meios para exercer a gratuidade do ensino. Para isso, as três universidades públicas estaduais devem ter uma política de permanência estudantil.
Glaucius Oliva (diretor do Instituto de Física de São Carlos)
A USP tem dado contribuições extraordinárias a São Paulo e ao Brasil. O século 21 trará inúmeros novos desafios ao Brasil e ao mundo. As universidades em todo o mundo têm passado por uma crise legitimidade, sendo questionadas pelas sociedades que as sustentam. Um grande desafio para o futuro é o que fazer em relação a um modelo de produção de conhecimento descontextualizado das demandas e necessidades da sociedade. O incentivo ao conhecimento requer abordagem moderna da pesquisa e da formação acadêmica. A USP tem missão de excelência e qualidade no sistema de ensino superior brasileiro. Nossos cursos de graduação devem ser os melhores do País, comparáveis aos melhores do mundo. É preciso promover uma reestruturação administrativa que faça diminuir a energia gasta nas atividades-meio, para que ela possa ser direcionada às atividades-fim. Outro desafio novo é incorporar o tema da sustentabilidade.
João Grandino Rodas (diretor da Faculdade de Direito)
Para que a graduação cresça sem perder a qualidade, é necessário haver descentralização e desconcentração dos poderes, promovendo mais equilíbrio entre a Reitoria, as pró-reitorias e as unidades. As unidades devem ter mais liberdade para procurar o seu caminho dentro do selo da USP. Ou seja, ter mais possibilidade de desenvolver, dentro de regras básicas gerais, suas atividades fundamentais, especialmente a pesquisa. A descentralização sozinha não resolve a questão da burocratização. Qualquer tensão, mesmo que periférica, chega ao centro. A Universidade não é o locus para o uso da violência e da força. Esse círculo vicioso não pode continuar. É necessário estabelecer o diálogo e a negociação como meios de resolução dos conflitos. A USP deve olhar para fora, ter diálogo mais aberto com os meios políticos municipais, estaduais e federais e com a iniciativa privada. O grupo Compromisso USP imagina que este é o momento da USP resolver os seus grandes problemas. Rearranjar os aspectos micro, na nossa visão, é insuficiente.
Ruy Alberto Altafim (pró-reitor de Cultura e Extensão Universitária)
Nosso projeto é de excelência com participação. O reitor será o grande coordenador. Precisamos de uma gestão de comunicação mais aberta, revitalizando as relações com a sociedade, o governo e as empresas. A USP tem participado intensamente do desenvolvimento da nação em atividades como agronegócio, as engenharias, o direito, as artes e a cultura, mas muitos ainda não conhecem isso. Temos que buscar a excelência interna e externamente. A USP é um orgulho do País, é a primeira do ranking das universidades na América Latina. Temos que trabalhar com planos estratégicos em várias áreas, como a internacionalização.
Silvio Sawaya (diretor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo)
Lembro do discurso de Julio de Mesquita Filho (um dos patronos do jornal O Estado de S. Paulo e integrante do grupo fundador da USP) na formatura da turma da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras em 1937: "A vossa licenciatura pela primeira vez no decorrer de sua evolução parece atuar nos destinos da nacionalidade ( ). Assim o fato de nos acharmos prontos a preencher uma lacuna centenária, que nos relegava à condição humilhante e subalterna de colônia intelectual, passa a assinalar profundas transformações em nosso meio. Encerrastes um ciclo de vossa existência para dar início a outro, o da nossa maioridade intelectual". A modernidade do país, naquele momento, era ser contemporâneo ao mundo e a USP participou ativamente desse processo. A USP é parte integrante dessa maioridade que conseguimos. O mérito do conhecimento é a sua missão fundamental. A USP quer ser mais democrática, mais aberta, rever seus estatutos, rever suas estruturas, mas reforçando a afirmação de ponta que este país espera de nós.
Sonia Penin (diretora da Faculdade de Educação)
Temos que olhar o futuro visualizando o passado e o presente. A criação da USP em 1934 foi justamente a superação da derrota de São Paulo nas armas. A Universidade tem que pensar em superação para avançar. Qual é a qualidade e a excelência que vamos precisar ter? Quais os nossos critérios de excelência? Temos um problema incrível na educação brasileira, das séries iniciais à pós-graduação. Precisamos propor políticas públicas para gerar mais igualdade e menos injustiça, mas também dar exemplos de como isso pode acontecer no País. É preciso qualificar ainda mais nossa excelência e distribuí-la melhor pelo País. Os visionários dos anos 30 criaram a USP e está na hora dela se recriar e se reorganizar para distribuir melhor sua excelência para o Estado e o País. A USP deve trabalhar para ser exemplo de democracia e de discussão dos problemas nacionais, como educação e desenvolvimento.
Wanderley Messias da Costa (coordenador da Coordenadoria de Comunicação Social)
O novo reitor deve compreender que os conflitos são inerentes à democracia. Podemos inclusive transformá-los em coisas educativas para os alunos quanto à prática da democracia. A USP deve ser mais moderna, ela é arcaica em sua gestão. Que diminua a distância entre a excelência em sua pesquisa, ensino etc. e o quadro de sua gestão. Precisamos ter uma melhor estrutura para dialogar com a sociedade, seja a paulistana, a do Estado e a federal. É preciso reconstruir as relações com o governo do Estado e a Assembleia Legislativa. A USP deve fazer sua inserção continental de forma mais presente com os países latino-americanos. A liderança política regional do País pode se traduzir em científica e cultural a partir da Universidade. O próximo reitor deve ter um olhar generoso para os seus pares. O corpo docente e os funcionários permanecem no mesmo número, enquanto a graduação dobrou em vinte anos. Os professores estão ganhando pouco em comparação às demais carreiras de Estado.