Peter Schultz escreve para a revista ComCiência, que acaba de lançar um dossiê sobre universidade pública
A universidade necessária de Darcy Ribeiro completa 50 anos. Lançado em 1969, o livro é composto por textos escritos nos dois anos anteriores. Remete, portanto, a tempos difíceis, precisando ser relembrado agora, novo momento complexo para a educação em nosso país. O livro é sobre a universidade pública para uma América Latina atolada no subdesenvolvimento e mergulhada em ditaduras durante a Guerra Fria de então. Hoje, o contexto parece diferente e, apressadamente, pode-se dizer que as questões colocadas na obra seriam então anacrônicas. Hipótese que se revela falsa, pois muitas das questões continuam em aberto e, assim, persistem e permanecem atuais.
As críticas de Darcy Ribeiro ainda são, em grande medida, pertinentes e muitas de suas ideias foram incorporadas apenas no discurso – e esquivamo-nos de suas advertências. As resistências ao necessário na época continuam ao que é imprescindível hoje. Por outro lado, parte do que Darcy Ribeiro propunha foi sendo incorporado, mas agora corre o risco de ser desconstruído. Em resumo, a universidade necessária passa a ser também urgente.
O livro é apresentado por Anísio Teixeira, mestre e amigo de Darcy. Ambos são obrigatórios em qualquer discussão sobre universidade no Brasil[i]. No final da apresentação, o propósito é anunciado: “O livro é a resposta ao desafio dos tempos presentes e a chave para a grande transformação: da universidade-reflexo para a universidade necessária”.
De 1969 para 2019, podemos identificar uma grande transformação, mas é preciso pensar o quanto a universidade é a reflexa e o quanto ela é a necessária. Em 1969, não havia ainda um sistema regular de financiamento à pesquisa no Brasil. A Fapesp, por exemplo, iniciara suas atividades há poucos anos; o primeiro plano nacional de pós-graduação, política que alavancou a pesquisa no Brasil, surgiu na década de 1970. A universidade brasileira apenas começava a se reestruturar, abandonando as antigas cátedras em favor de departamentos.
Essa reestruturação, no entanto, foi fomentada por agentes externos, os famosos acordos MEC-USAid, assim como o financiamento à pesquisa era fortemente dependente de agências estrangeiras. A expansão do ensino superior, em número de vagas, viria apenas nas últimas décadas do século XX, fortemente calcada na iniciativa privada e com uma significativa contribuição da esfera pública nesse início do século XXI, aliada às políticas de inclusão social.
Reestruturação, expansão, inclusão, financiamento autóctone da pesquisa, um sistema de pós-graduação eram recomendações para a universidade necessária, mas satisfeitas, talvez, em grande parte de modo reflexo. Na introdução de seu livro, Darcy Ribeiro define a modernização reflexa em contraponto ao crescimento autônomo e o índice da obra, que ilustra esse artigo, é o seu roteiro para abordar a origem, o balanço e a proposta para resolver o dilema.
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