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Expresso 222

À sombra dos Montes Cárpatos (18 notícias)

Publicado em 10 de setembro de 2024

Este ano o Núcleo de Pesquisa e Divulgação em Evolução Humana, do Instituto de Estudos Avançados da USP e o Museu de Arqueologia e Etnologia, também da mesma universidade, lideraram a implantação de um projeto paleoantropológico na Romênia, com recursos da FAPESP e do CNPq. A paleoantropologia é a disciplina que estuda a evolução humana, tanto de um ponto de vista dos fósseis humanos, quanto dos vestígios deixados pelo homem pré-histórico, como por exemplo, suas ferramentas de pedra lascada e de osso e os restos de sua alimentação.

O projeto está sendo desenvolvido em parceria com a Universidade de Valahia, daquele país. Duas campanhas de campo já foram desenvolvidas, uma em abril/maio e outra em agosto/setembro deste ano. O projeto foi estabelecido tendo em vista que os Bálcãs foi a porta de entrada do Homo sapiens na Europa, vindo da África, onde surgiu por volta de 200 mil anos.

A campanha de abril/maio serviu basicamente para estreitar os laços com os colegas romenos e fazer uma primeira visita de reconhecimento da região onde o projeto será desenvolvido, o Vale do Rio Varghis, nos Montes Cárpatos, na Transilvânia, bem como de suas cavernas. Já a segunda etapa, mais longa, envolveu as primeiras escavações brasileiras em solo romeno. Essas escavações concentraram-se em uma gruta específica, a caverna de Tartarului, nunca antes escavada. Em paralelo, duas outras grutas foram escavadas pela equipe romena.

Infelizmente a caverna por nós escavada não mostrou sinais da presença ali do homem pré-histórico. A expectativa era que quando as escavações atingissem os 40 mil anos, esses vestígios fossem encontrados. Mas isso não ocorreu. Talvez pelo fato de que seu acesso é muito difícil e perigoso. Já os romenos, liderados por Marian Cosac, George Muratoreanu e Stefan Vasile, tiveram mais sorte. As duas cavernas por eles escavadas, a Péstera Mare e o Abri 122 mostraram grande quantidade de vestígios arqueológicos, incluindo aí muito material de pedra lascada e restos de animais, muito provavelmente consumidos pelos grupos humanos pré-históricos que ali viveram, por volta de 40 mil anos. Entretanto, nelas, também, não foram encontrados fósseis humanos.

Mas a equipe brasileira não se restringiu à escavação de Tatarului. Giancarlo Scardia, da UNESP de Rio Claro, juntamente com Augusto Auler, do Instituto do Carste de Belo Horizonte, realizaram um mapeamento preciso das grutas do vale, bem como recolheram amostras de diversos perfis em diversas grutas para tentar entender a gênese e o preenchimento dessas cavidades. Esse é um trabalho de base, essencial para o empreendimento de futuros trabalhos de cunho arqueológico.

Ximena Villagrán, do MAE-USP, recolheu várias amostras estruturadas de perfis arqueológicos de sítios escavados no passado pelos romenos para entender o processo de formação desses sítios, incluindo aí o grau de pisoteamento por parte dos homens que os formaram. André Strauss e Rodrigo Elias de Oliveira, ambos do MAE-USP, coletaram amplamente amostras de sedimentos desses mesmos sítios para procurar neles vestígios de DNA das diversas espécies de hominínios que viveram no Varghis ao longo dos milênios.

Além do trabalho de campo, duas outras atividades paralelas foram também desenvolvidas: Walter Neves e Clóvis Monteiro, do IEA-USP, ministraram na sede da Universidade de Valahia, em Targoviste, um curso introdutório sobre evolução humana para alunos romenos e ambos também estiveram por dois dias em Bucareste medindo o crânio de Cioclovina, datado por volta de 30 mil anos, um dos três dessa idade existentes em todo o norte dos Bálcãs. Durante a estadia em Targoviste, Walter e Clóvis foram oficialmente recebidos por dois pró-reitores da Universidade de Valahia com o objetivo de estreitar a cooperação interinstitucional entre Romênia e Brasil.

No próximo ano, a equipe brasileira-romena juntar-se-á novamente no Vale do Varghis para dar prosseguimento às pesquisas geológicas, espeleológicas e arqueológicas que se iniciaram este ano, desde que fundos suplementares sejam obtidos junto à FAPESP e ao CNPq.