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A REENGENHARIA DO BOI

Publicado em 14 maio 2003

Por Marcos Coronato
Foi dada a partida numa empreitada científica que poderá injetar algumas centenas de milhões de dólares nas exportações brasileiras — e um prazer adicional a qualquer um que aprecie um churrasco. É o projeto Genoma Funcional do Boi, que pretende estudar os genes do rebanho brasileiro para resolver alguns de seus principais problemas: carne pouco macia e crescimento vagaroso. "O objetivo final é melhorar a qualidade da carne para conseguir bons preços, e novos mercados", afirma o empresário Jovelino Mineiro, dono da Central Bela Vista, uma fazenda de genética bovina de Pardinhos" no interior paulista. A Bela Vista e a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) investem, cada uma 500 000 dólares na fase inicial do projeto. A iniciativa nasce com uma característica bem diferente de outros projetos genoma: ambiciona percorrer rapidamente caminho do laboratório ao mercado. O "funcional" do nome significa que os pesquisadores não estão atrás de um mapa estático de todos os genes do animal, e sim de um sistema dinâmico que mostre como agem apenas os genes importantes para a qualidade da carne — por exemplo, aqueles que controlam crescimento, acúmulo de gordura e construção de músculos. Segundo o biólogo Luiz Coutinho, da Esalq, escola superior - de agricultura da USP, em apenas dois anos será possível obter os primeiros resultados. Entrarão em cena, então, as empresas,, interessadas em parceria. Elas poderão transformar o conhecimento obtido em produtos e serviços, como testes genéticos para identificar os melhores reprodutores, vacinas, proteínas, rações — e, num futuro mais distante, bois transgênicos. O rebanho brasileiro , é composto principalmente da Raça indiana Nelore, que tem vantagens e desvantagens. Ela resiste bem às agruras do clima tropical, propício a parasitas e doenças. Graças à rusticidade da raça Nelore, o Brasil chegou à condição de potência mundial da pecuária de corte: Possui o maior rebanho comercial do mundo e produz 7,15 milhões de toneladas de carne bovina por ano. É o terceiro maior exportador do globo, atrás de EUA e Argentina: em 2002, vendeu ao exterior 593 000 toneladas ou 1,1 bilhão de dólares. A previsão é que o volume exportado cresça 10% neste ano. Os números vistosos, porém, não escondem os pontos fracos do Nelore. Sua carne não tem a mesma maciez que a das raças mais difundidas na Argentina e nos EUA, como as européias Abeerden-Angus e Hereford. O ponto de abate é a partir dos 26 meses (20 em outras raças) e as fêmeas tornam-se sexualmente maduras com 30 meses (24 em outras raças). Por isso, o Brasil abate por ano apenas 20% do seu rebanho, taxa bem inferior aos 38% da Argentina e aos 42% dos EUA. Não é possível garantir que uma pesquisa em genômica vá resolver esses problemas. Afinal, trabalhos do tipo se situam na fronteira do conhecimento humano e não há experiência prévia que sirva de referência — o que não compromete, porém, sua lógica de mercado.