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A pós-verdade no CIAD (1 notícias)

Publicado em 21 de setembro de 2018

Foi realizado nos dias 12, 13 e 14 de setembro de 2018 o V Colóquio Internacional de Análise do Discurso (CIAD), na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) sob a organização do PPGL (Programa de Pós-Graduação em Linguística) e dos Grupos LIRE e LABOR, com o apoio da CAPES e da FAPESP. O tema desta edição foi “Discurso e (pós)verdade: efeitos de real e sentidos da convicção”. Estive presente e foi muito proveitoso participar de debates tão profícuos.

O que falar sobre a verdade como uma construção discursiva? Na era das fake news, é preciso pensar que a construção da verdade é ideológica. Ela joga com os sentidos do sujeito e com seus posicionamentos perante a sociedade. Há um jogo político e simbólico em que o que é verdade para um determinado grupo é mentira para outro. Quando há a disseminação de notícias falsas, há um mecanismo do poder e do saber em que predomina uma vontade de verdade para manobrar as massas e conseguir dominação, alienação e submissão destas à vontade de um grupo minoritário que controla as instâncias de poder e a economia de um país, para se manterem numa elite que abarca riquezas e poderios.

Estudar os discursos sobre a verdade e a pós-verdade é um exercício analítico e também epistemológico em buscar nas teorias dos estudos do discurso o lugar que ocupa este conceito. Maria do Rosário Gregolin, estudiosa da Análise do Discurso no Brasil, abraçando e introduzindo os estudos e pensamentos de Michel Foucault nesse campo de análise, em sua fala perseguiu esse caminho. Ela chamou a atenção para a aula inaugural que Foucault proferiu no Collège de France em 1970 que saiu publicada no Brasil com o título “A ordem do discurso”. Nela, Foucault descreve alguns mecanismos de controle do discurso. Para ele, a inquietação “o que há de tão perigoso quando um homem fala” é a sua mobilização do discurso no seio da sociedade. Essa vontade de verdade está ligada para Foucault ao “modo como o saber é aplicado em uma sociedade, como é valorizado, distribuído, repartido e de certo modo atribuído” (FOUCAULT, 2010, p. 17).

Pensando também com a História Cultural a verdade pode ser uma representação. As práticas de representação foram imensamente estudadas por Roger Chartier, historiador da História Cultural, que tem como seu objeto de estudo a história da leitura e do livro nos séculos XVI e XVII. Ele esteve presente no Colóquio e após a apresentação do grupo LIRE – Laboratório Interdisciplinar de Estudos das Representações do Leitor Brasileiro Contemporâneo –, coordenado por minha orientadora de doutorado, Profa. Dra. Luzmara Curcino, se reuniu com os integrantes do grupo para comentar os trabalhos (foto).

Partindo para os campos de estudos particulares em que na pesquisa de doutorado eu analiso os discursos sobre a implantação dos livros didáticos no Brasil, é preciso pensar a verdade e a pós-verdade deste discurso em que se num momento o acontecimento é divulgado como uma proposta do MEC para implantar tais recursos nas escolas públicas, num segundo momento a prática não é instituída. Então, podemos perguntar qual a verdade de tais práticas? E em outros estudos que realizo sobre a divulgação de práticas de leitura e representação do leitor por meio de booktubers, há um questionamento se tal prática é válida se é uma crítica literária, o que há de verdadeiro nesse discurso.

São práticas que a verdade e a pós-verdade vão construindo e que só são possíveis pelo exercício da linguagem, pelo qual o homem se (re)significa e atribui sentidos em suas diversas práticas sociais que se discursivizam, pois somos seres simbólicos.