Uma recente pesquisa que descobriu 8 milhões de mutações inéditas no DNA brasileiro pode mudar a medicina.
Para o pós-PhD em Neurociências Fabiano de Abreu Agrela Rodrigues, a relevância do estudo está além da quantidade de mutações: está na diferença de interpretação genética em populações miscigenadas como a brasileira
Recém-publicado na revista Science, um artigo associado ao tema revelou que o genoma de brasileiros contém mais de 8,7 milhões de variantes genéticas nunca antes registradas em bancos internacionais. A pesquisa, que sequenciou o DNA de 2.723 indivíduos de diferentes regiões do país, acendeu o debate sobre a urgência de integrar a diversidade genética brasileira às práticas clínicas e diagnósticas da medicina de precisão.
Para o Dr. Fabiano de Abreu Agrela Rodrigues, pós-PhD em Neurociências, especialista em Genômica e licenciado em Biologia, a descoberta é um divisor de águas, mas requer aplicação prática responsável e contextualizada. Membro de instituições científicas internacionais como a Society for Neuroscience (EUA), a European Society of Human Genetics, a Royal Society of Biology e a Royal Society of Medicine, o pesquisador alerta para o risco de interpretações equivocadas baseadas exclusivamente em dados de populações europeias.
“A importância deste estudo não está apenas nas mutações inéditas, mas principalmente nas predisposições mais comuns, que podem ser interpretadas de maneira incorreta quando analisadas com base em genomas de outras populações”, afirma o neurocientista.
A crítica de Abreu Agrela se refere ao fato de que a maioria das bases genéticas utilizadas hoje em testes e relatórios clínicos têm predominância europeia. Isso compromete a confiabilidade dos resultados quando aplicados à população brasileira, cuja ancestralidade é miscigenada, com forte componente indígena e africano.
“A explicação é simples do ponto de vista biológico: se um alelo apresenta um efeito positivo ou negativo em determinada população, o que garante que esse mesmo efeito se repita em outra população, com outra combinação ancestral?”, questiona. “Imagine, por exemplo, que o alelo A esteja relacionado ao metabolismo mais rápido de um medicamento em europeus. Nada garante que, em uma população miscigenada, esse mesmo alelo se comporte da mesma forma. Pode até ter o efeito oposto”, completa.
Segundo ele, essa complexidade já é conhecida por quem trabalha com genômica, motivo pelo qual os laudos genéticos sérios já trazem margem de erro. “Esses relatórios precisam ser sempre acompanhados por exames clínicos que confirmem ou refutem a influência efetiva da genética sobre a manifestação fenotípica”, explica.
CORREÇÃO DE DISTORÇÕES
O novo banco genético brasileiro, fruto do projeto DNA do Brasil, poderá corrigir distorções históricas. Para isso, no entanto, precisa ser utilizado com responsabilidade e ser acessível a centros de pesquisa, universidades e ao sistema público de saúde.
“Este estudo é extremamente valioso, mas ele tem que estar liberado para uso técnico e científico em prol da população brasileira, e não apenas como matéria de vitrine para a mídia”, destaca.
A longo prazo, a expectativa é que esses dados sirvam de base para o desenvolvimento de testes genéticos mais calibrados, tratamentos personalizados e políticas públicas de saúde mais eficazes, ajustadas à realidade biológica do Brasil.
“Compreender a nossa própria diversidade genética é o caminho para reduzir falhas diagnósticas e ampliar a eficácia de tratamentos. Essa é uma conquista científica que só faz sentido se for aplicada à vida real”, conclui o Dr. Fabiano de Abreu Agrela Rodrigues.
No CPAH – Centro de Pesquisa e Análises Heráclito, utilizamos imputação genômica com base em um grupo controle composto por mais de 200 brasileiros, garantindo maior precisão e compatibilidade nos resultados ao refletir melhor as características genéticas da nossa população.
Escrito por Marcus Frediani