Carl Sagan foi um cientista bastante reconhecido em seu ramo de atuação, a Física dos astros e estrelas. Além de professor da Universidade de Cornell, uma das mais prestigiadas dos Estados Unidos, foi consultor da NASA, a agência espacial americana. Recebeu muitos prêmios e até emprestou seu nome a um asteroide, algo tido como o auge para um astrônomo. Suas pesquisas ajudaram a desvendar mistérios de planetas como Marte e Vênus, bem como de Titã, o maior satélite de Saturno.
A contribuição do Dr. Sagan ficaria restrita aos seus colegas de profissão contemporâneos e posteriores, não fosse outro talento que possuía: o de se comunicar com o grande público. Dessa maneira, é impossível falar de Carl Sagan sem mencionar a série para a televisão "Cosmos", na qual, com didática e clareza, explicava mesmo os assuntos aparentemente mais complexos com os quais ele trabalhava. Por exemplo, foi notável a ideia de condensar toda a idade geológica do universo, algo em torno de 14 bilhões de anos, em um só ano, e localizar nesse calendário cósmico acontecimentos como a origem da Terra ("25 de setembro") e o surgimento dos dinossauros ("27 de dezembro") e dos humanos ("31 de dezembro"). Com isso dá para ter uma noção de como nossa vida - considerando cerca de 80 anos - é insignificante, aproximadamente 0,16 "segundos cósmicos".
As ações midiáticas de Carl Sagan tornaram a Astronomia e a Astrofísica mais conhecida da população mundial, motivando interesses diversos, discussões por leigos, valorização de cientistas que atuavam no setor em vários cantos do mundo e mais pessoas querendo estudar esse tipo de assunto. Porém, acredita-se que a ideia do Dr. Sagan em popularizar o que ensinava e pesquisava acabou sendo usada para angariar, em alguns países, simpatia ao programa aeroespacial americano, na época em disputa com a extinta União Soviética. Exatamente o contrário do que queria o homem que muitos dizem ter sido um dos responsáveis pelo fim da Guerra Fria. Ou seja, nesse caso, a divulgação da ciência e da tecnologia pode ter sido manipulada para interesses não necessariamente nobres.
Nesse sentido, a revista "Pequisa FAPESP", órgão oficial de divulgação científica da Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de São Paulo, na sua edição de maio de 2013, trouxe um exemplo desse tipo de manipulação, nos anos 50, por um órgão da imprensa sensacionalista brasileira, "O Diário da Noite". Segundo a reportagem, baseada em pesquisa científica, o jornal, divulgando informações científicas no meio de notícias comuns, transmitia o pensamento do seu proprietário, Assis Chateaubriand. Ele acreditava que a ciência e a tecnologia poderiam tirar o país do atraso e acabar com a ignorância das massas.
Independentemente se estavam ou não bem intencionados, os exemplos de Sagan e Chateaubriand são interessantes para que se exponha que, como em qualquer outro segmento jornalístico (política, economia, esporte, cultura, segurança etc.), o jornalismo científico deve se basear numa imprensa livre. Assim, pode divulgar com isenção e precisão o trabalho de pesquisadores por todo o mundo. Essa divulgação com isenção e precisão é extremamente importante, pois o mundo de hoje é completamente diferente da época de Chateaubriand ou de Sagan e a ciência tem uma grande parcela de responsabilidade nessas mudanças. Quanto maior a idade da pessoa, mais ela testemunhou em termos de alterações nas comunicações, construções, materiais, equipamentos, automóveis, armazenamento de dados, medicina e meio ambiente, somente para citar alguns exemplos.
A ciência e tecnologia ainda vão mudar muita coisa, então cabe aos que estudam os mais variados ramos do conhecimento ajudar a explicar o que está acontecendo. Tão importante quanto isso é explicar também o que aconteceu, bem como tentar predizer o que acontecerá daqui para frente. Nesse contexto, a comunicação científica tem o dever de ser ampla, isenta e precisa, de modo a informar a população sobre, por exemplo, benefícios e malefícios de uma nova tecnologia ou sobre um novo tratamento para determinado problema de saúde. Munida de informações, a população pode reivindicar seus direitos perante uma empresa ou governo, ou ainda discutir com mais propriedade sobre problemas globais, nacionais, regionais ou locais.
* Sandro Donnini Mancini (www.sorocaba.unesp.br/professor/mancini; mancini@sorocaba.unesp.br) é professor da Unesp de Sorocaba (www.sorocaba.unesp.br) para os cursos de graduação em Engenharia Ambiental, Mestrado e Doutorado em Ciência e Tecnologia de Materiais e Mestrado em Engenharia Civil e Ambiental. Escreve a cada duas semanas, às terças-feiras, neste espaço.