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Correio Popular (Campinas, SP)

A educação pela música (1 notícias)

Publicado em 30 de dezembro de 1999

Por WASHINGTON DE CARVALHO NEVES
O mestre das rabecas José Eduardo Gramam (1944-1998) viveu apenas 54 anos. Em compensação, deixou uma discografia intensa de propósitos musicais, histórias e lembranças entre colegas e alunos do Departamento de Música do Instituto de Artes da Unicamp e a defesa amorosa do instrumento que lhe deu respeito e fama. Como já disse a música e ex-mulher, Glória Cunha, Gramani foi pura música, uma provocação. Autodidata, chegou a Campinas em 1976, com a família, para trabalhar como concertino na Orquestra Sinfônica. Em seguida, tornou-se professor de rítmica na Unicamp e dois livros técnicos na área, escritos por ele, ganharam rápida repercussão no meio musical. A pesquisa de Gramani chegou a escolas estrangeiras - que elogiaram de imediato o arrojo e ineditismo das propostas. Gramani foi um devorador de livros sobre educação, principalmente da obra de Paulo Freire, outro revolucionário do ensino no País. A carreira como professor, como não poderia deixar de ser, era o ato de repassar com arte o conhecimento musical e humano. Como músico deixou registros que não escapam do chavão: qualidade em vez de quantidade discográfica. Poucos e seletos discos que se tornaram encruzilhada para quem quer conhecer sobre a música antiga e as possibilidades da rabeca. Trilhas, Espiral do Tempo, Mexericos da Rabeca e Terra Sonora são CDs lançados pelo compositor, regente e arranjador. A faceta mais produtiva de Gramani foi como pesquisador apaixonado pela rabeca. O instrumento de cordas, quase em extinção e usado popularmente apenas em alguns núcleos do País, fez com que viajasse para locais onde a rabeca ainda é cultuada. Esteve em Morretes (Paraná), Iguape (São Paulo) e Marechal Deodoro (Alagoas) e acabou colecionando rabecas de várias procedências e formatos. Em 1995, criou o Centro de Estudos da Rabeca com auxílio financeiro da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estudo do Estado de São Paulo (Fapesp). Aliados a ele na perpetuação do instrumento, estiveram em parceria o ator Antonio da Nóbrega e os músicos Passoca e Zé Gomes. Ele admitia que a rabeca é um instrumento de difícil aprendizado pelo fato de não ter recursos semelhantes aos do violão e da viola. Mas não gostava de traçar comparação entre a rabeca e o violino. Não dá para dizer se é melhor ou pior. É um som diferente e a música bem executada que sai da rabeca é muito boa, afirmou certa vez. A trajetória do músico se estendeu também ao apoio e atuação em grupos musicais. Anima, Trio Bem Temperado, Oficina de Corda e Trem de Corda são alguns dos mais representativos. Colaborou como arranjador e compositor para grupos de outras cidades, como Noivas do Alffredo, de Curitiba. Passou ainda pela Orquestra Sinfônica da Universidade de Londrina. Alguns anos antes de morrer, demonstrou interesse pela fotografia. Em 1996, realizou exposições fotográficas de rabecas que pesquisou. Antes disso, deu vazão à literatura com o livro Contraponto - coletânea de poemas.