Notícia

Jornal da USP

A ciência aplicada aos nelores

Publicado em 09 junho 2003

Por ALICIA NASCIMENTO AGUIAR, de Piracicaba
Mais do que apenas seqüenciar o DNA bovino, o Projeto Genoma Funcional do Boi investigará as funções dos genes do animal, o que poderá levar à descoberta de mecanismos genéticos capazes de melhorar a produção de carne e leite O Projeto Genoma Funcional do Boi - lançado pela Fapesp no dia 7 de maio - abre novas oportunidades de pesquisa e avança na forma de desenvolver estudos em genômica, pois ele realizará simultaneamente o seqüenciamento e a análise funcional de genes visando à sua aplicação. O projeto está sendo desenvolvido por pesquisadores do Programa Genomas Agronômicos e Ambientais (AEG) da Fapesp, que reúne 20 laboratórios da Rede Onsa, instituto virtual de genômica criado em 1997 pela fundação. O projeto é coordenado pelo professor Luiz Lehmann Coutinho, do Laboratório de Biotecnologia Animal da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da USP, em Piracicaba, e está focado nos animais da raça nelore, que é a mais importante da bovinocultura brasileira. Coutinho trabalha em parceria com outros dois cientistas, os professores da Universidade Estadual Paulista (Unesp), em Botucatu, Luís Roberto Furlan e Antonio Carlos Silveira. O prazo previsto para a conclusão do projeto é de 18 meses. O interesse em estudar o genoma do boi está vinculado ao fato de a bovinocultura ser de extrema importância para o Brasil. O boi brasileiro ganhou prestígio no exterior como alimento natural e saudável. Com custos baixos, preços competitivos e clima que favorece a produção durante o ano todo, o Brasil tornou-se grande exportador de carne bovina, além de reunir condições ideais para conquistar a liderança do mercado mundial de carne vermelha. Conta com um rebanho estimado de 170 milhões de cabeças e ocupa hoje o terceiro posto no ranking dos maiores exportadores mundiais de carne bovina. Investimento - A pesquisa sobre o genoma do boi vem atender às expectativas de um empresário ligado à área de genoma bovino que investe em pesquisas de melhoramento genético e da qualidade da carne, sempre em parceria com universidades. Jovelino Mineiro, proprietário da Central Bela Vista Genética Bovina, acredita que o sucesso comercial depende do conhecimento científico que será gerado por esse projeto. O empresário ressalta que, transformando ciência em tecnologia aplicada, soluções poderão surgir na pecuária nas áreas de imunologia, reprodução, precocidade e qualidade de carne. A Central Bela Vista é responsável por 50% do financiamento do projeto, cabendo à Fapesp o financiamento dos outros 50%. Além de abrir novas perspectivas para a parceria entre a iniciativa privada e o ambiente acadêmico, o projeto tem como objetivo identificar genes que possam ser utilizados para desenvolver produtos e tecnologias para aumentar a produção bovina, procurando melhorar a qualidade da carne, a eficiência reprodutiva dos animais e a resistência do rebanho. Ele visa não só a seqüenciar, mas a associar função a esses genes, que serão encontrados na seqüência - por isso é chamado de genoma funcional. Para Coutinho, o processo de seqüenciamento está se aperfeiçoando. Enquanto nos primeiros projetos o objetivo era obter o maior número de genes, no Genoma Funcional do Boi a intenção é de atacar problemas, coletando tecidos específicos para encontrar os genes responsáveis pela característica em que se tem interesse. Dessa forma são feitas coletas de tecidos - da hipófise e do hipotálamo, dos sistemas reprodutivos, imunológico e digestivo do boi - para posterior construção de bibliotecas de cDNA (genes expressos). A partir daí é feito um seqüenciamento dessas bibliotecas para obter o catálogo dos genes. Com esses genes é possível desenvolver estratégias para tentar identificar quais deles conferem, por exemplo, a precocidade sexual ao animal. Existe um interesse muito grande em genoma comparativo, isto é, comparar uma informação do genoma humano com o de outras espécies. Sabe-se que o genoma do boi tem tamanho similar ao humano. Com sua análise funcional é possível aumentar a produção e a segurança dos alimentos, como carne e leite, e ainda ajudar os pesquisadores a aprender mais sobre o genoma humano. Comparando o material genético do ser humano com o de outros organismos, é possível entender melhor a estrutura e função de genes do homem e desenvolver novas estratégias de combate a doenças.