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A Butanvac é ótima notícia, mas o prazo anunciado é difícil de cumprir, dizem cientistas

Publicado em 27 março 2021

Por Da redação

A notícia de que a primeira vacina contra a covid-19 100% brasileira vai começar os testes clínicos pegou todo mundo de surpresa — e até cientistas que trabalham diretamente com o assunto não estavam sabendo da novidade. A Butan vac, anunciada pelo Governo do Estado de São Paulo e pelo Instituto Butantan numa coletiva de imprensa realizada na manhã da sexta-feira (26), depende do aval da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para iniciar os estudos com seres humanos ainda no mês de abril. A conquista foi muito comemorada pelo governador paulista, João Doria, e pelo diretor do Butantan, Dimas Covas.

“Este é um anúncio histórico para o Brasil e para o mundo. A Butan vac é a primeira vacina 100% nacional, integralmente desenvolvida e produzida no Brasil pelo Instituto Butantan, que é um orgulho do Brasil ”, disse Doria. O governador também projetou que haveria condições para disponibilizar `` 40 milhões de doses, se possivel, em julho ”. Apesar do desenvolvimento de uma vacina significar um avanço importantíssimo para a ciência brasileira, pesquisadores independentes entrevistados pela BBC News Brasil levantaram questões sobre as promessas feitas e transparência das informações apresentadas até o momento, como você confere a seguir. Tradição de décadas

De acordo com os detalhes compartilhados durante o evento, a Butan vac é uma vacina feita a partir de um vírus que causa a doença de Newcastle em aves. Esse agente infeccioso não provoca nenhum mal no organismo humano. No laboratório, o vírus da doença de News castle passou por um processo de engenharia genética para receber a proteína S do coronavírus — a letra `` S ” vem de spike, ou espícula em português, que é a parte da estrutura viral que se encaixa nos receptores da superfície das células humanas para iniciar uma infecção. O vírus então é multiplicado em ovos e é purificado e inativado antes de ir para as vacinas.

Esse processo é relativamente barato e fácil de ser feito. A ideia é que, a partir da imunização, o sistema de defesa do nosso corpo reconheça essa proteína S típica do coronavírus e gere uma resposta capaz de nos proteger de uma infecção de verdade. `` Essa é uma plataforma tecnológica muito segura e com a qual o Brasil tem muita experiência ”, avalia O imunologista Carlos ZárateBladés, pesquisador da Universidade Federal de Santa Catarina. O mesmo recurso é usado em outros imunizantes nos quais o Brasil tem um bom histórico de produção e é auto suficiente (ou seja, não precisa de insumos estrangeiros).

O caso mais notório é a vacina contra a gripe: o Butantan usa essa mesma metodologia e entrega, todos os anos, mais de 100 milhões de doses ao Plano Nacional de Imunizações do Ministério da Saúde. Prazo apertado A larga experiência nacional pode acelerar a produção da Butan vac, mas, antes que isso ocorra, é necessário que o candidato à imunizante passe pelos testes clínicos para garantir a segurança e a eficácia. Geralmente, esses estudos são divididos nas fases um, dois e três, e cada uma delas tem objetivos diferentes.

` Nas fases um e dois, nós avaliamos se a vacina é tolerada, qual a melhor dosagem para obter uma boa resposta no organismo, se ela é segura e se realmente tem efeito no corpo humano ”, explica o imunologista Gustavo Cabral, pesquisador da Universidade de São Paulo e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Já a fase três, o último passo antes da submissão dos dados para aprovação pelas agências regulatórias, envolve dezenas de milhares de voluntários e tem a meta de definir a eficácia daquele produto em prevenir a doença (ou pelo menos as suas formas mais graves). Para serem iniciadas, as pesquisas com a Butan vac ainda precisam receber o aval da Anvisa — representantes do governo estadual e do Butantan dizem estar `` dialogando intensamente ” com a agência para que isso aconteça o mais rápido possível. Porém, mesmo com o provável início dos testes clínicos em abril, como desejam os gestores paulistas, é praticamente impossível finalizar todas as etapas até julho de 2021.