Jornal da Ciência
Editorial do mês de julho do Journal of the Brazilian Chemical Society é assinado por Angelo Cunha Pinto, acadêmico e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
As Memórias do Instituto Oswaldo Cruz, com 107 anos, é o mais antigo periódico científico brasileiro. As duas principais agências de fomento à pesquisa científica - O CNPq e a CAPES - só foram criadas em 1951, após a segunda Guerra Mundial, e a principal Fundação de Amparo à Pesquisa - a Fapesp - acaba de completar 50 anos.
A redemocratização do país foi acompanhada pelo que ficou conhecido como a "década perdida" e só depois da estabilização da moeda é que a ciência deu um grande salto, alcançando o 13o lugar no ranking mundial de produção científica, apesar de o Brasil ainda ocupar a 48a posição no número de artigos citados. Atingir estes patamares era impensável nos anos oitenta quando a palavra de ordem da comunidade científica era: O Brasil tem que ter massa crítica. Hoje são titulados anualmente mais de 50 mil mestres e doutores, apesar de esse número ser ainda reduzido face ao tamanho da população brasileira e às necessidades nacionais.
Chegar lá só foi possível porque houve grandes projetos, como, por exemplo, o PADCT, e o financiamento à pesquisa, apesar de em alguns períodos curtos ter sofrido cortes e contingenciamentos, não foi interrompido. O salto dado pela ciência brasileira não foi, entretanto, acompanhado pelo aumento da qualidade do Ensino Médio e do Ensino Fundamental. Esse é hoje o calcanhar de Aquiles que compromete o desenvolvimento econômico e penaliza uma grande parcela de jovens do estrato social mais desfavorecido.
A Educação Básica não pode ficar relegada a um segundo plano e ser considerada como gasto público. Deve sim, ser vista como investimento e constar das prioridades dos governos federal, estaduais e municipais. Educação é a principal plataforma para o futuro, e para que o futuro seja harmonioso e prevaleça o bem-estar social, os governantes devem enxergar a educação como uma política de Estado. Mas, esta não pode estar restrita à alçada dos governos. A sociedade deve participar e fazer-se ouvir sem se eximir de suas responsabilidades.
As Sociedades Científicas têm muito a contribuir para que a qualidade do Ensino Médio melhore e atinja o mesmo nível das nações desenvolvidas, e atenda com qualidade todos os jovens em idade escolar. A Sociedade Brasileira de Química pode, com sua experiência e a de seus associados, fazer sua parte, abraçando a causa da Educação Básica. Não é possível continuar convivendo com escolas que não têm laboratórios de química e onde pontifica a memorização nas salas de aula. A continuar este tipo de ensino, a Tabela Periódica não passará de um quadro nas paredes das salas de aulas. Os Institutos e Departamentos de Química das universidades públicas devem abrir suas portas para os estudantes do Ensino Médio, e os professores universitários não podem ignorar as escolas de seus bairros ou se esquecerem das escolas das periferias de suas cidades. Alguns Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia vêm mostrando que é possível levar os cientistas às escolas e os resultados tem sido excelentes. O pH do planeta foi um grande sucesso. Mas, estas duas iniciativas são pontos fora da curva.
A Sociedade Brasileira de Química deve assumir a bandeira da Educação Básica. Faz-se urgente a realização de um censo nacional em que fique claro para a sociedade qual é o déficit verdadeiro de professores de química nos sistemas público e privado. Disponibilizar no Portal de professores do Ministério de Educação material didático voltado para o professor do Ensino Médio, acompanhado de cursos de atualização à distância é outra atitude que pode ser tomada em curto prazo. É importante começar já para que se desencadeie um "tsunami" em prol da Educação. Uma andorinha só não faz verão, mas a Sociedade Brasileira de Química e seus associados podem revolucionar a química no Ensino Médio e mudar o Brasil para melhor. Neste país tudo é muito recente, inclusive a democracia. Sem educação não há futuro e a democracia é só de fachada.
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