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Nexo Jornal

4 contribuições de Alberto Dines para o jornalismo brasileiro

Publicado em 22 maio 2018

Por Carlos Eduardo Lins da Silva

“A imprensa é a herdeira natural da sociedade democrática moderna. Filha direta do ‘Aufklärung’, o Iluminismo. Desde meados do século17,I sabemos que a informação deve correr sem restrições. Cerca de quatro séculos depois estamos aprendendo, a duras penas, que essa liberdade irrestrita precisa ser acompanhada de responsabilidades também irrestritas. Cada palavra solta no espaço tem um peso, um preço, gera uma responsabilidade. Só assim o seu poder fiscalizador pode ser exercido sem prepotências e distorções.”

Em 2013, foi assim que o jornalista carioca Alberto Dines respondeu sobre o poder da imprensa. A entrevista foi feita à revista Ide, uma publicação semestral da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo.

Dines morreu em 22 de maio de 2018, aos 86 anos. Ele estava internado há dez dias no Hospital Albert Einstein, em São Paulo. Segundo informações da imprensa, ele pegou uma gripe da mulher, a jornalista Norma Couri, que virou pneumonia.

Para além de seus muitos trabalhos como repórter e editor, em revistas e jornais, Dines era considerado uma referência na crítica e análise do jornalismo brasileiro. Ele foi um dos pioneiros na construção de um repertório de conhecimento teórico e experimentação prática relativo à imprensa nacional. Entre os 15 livros que escreveu, parte considerável é sobre jornalismo e imprensa, entre eles “O papel do jornal”, de 1974, e “O papel e a profissão de jornalista”, de 2009.

Em entrevistas recentes, Dines ressaltou como a observação da mídia tinha se tornado uma prática corriqueira na era da internet, não sem consequências indesejadas. “Em certas camadas já se incorporou a noção de que a imprensa tem que ser discutida e questionada”, disse à Ide. “E, como em todos os avanços, esse traz um contrapeso penoso. Ninguém gosta de ser criticado. Graças às novas tecnologias, se criou uma série de opções informativas que fragmentaram e desorganizaram o processo informativo e o tornaram ainda mais vulnerável a toda sorte de interesses, idiossincrasias e deformações.”

Em 1963, Dines começou a dar aulas na PUC (Pontifícia Universidade Católica) do Rio de Janeiro. O jornalista decidiu usar as experiências em atividades diferentes que já acumulara (rádio, cinema, jornais da manhã e da tarde) em dez anos de profissão para promover reflexões sobre as diferentes plataformas.

Surgia então a disciplina de Jornalismo Comparado, que depois viraria parte do currículo dos cursos de jornalismo. “A ideia vinha do direito comparado”, lembrou Dines em entrevista de 2012 para a revista da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo). “A partir da comparação você consegue estabelecer diferenças e paradigmas.”

Alberto Dines trabalhou como editor-chefe do Jornal do Brasil, no Rio de Janeiro, entre 1962 e 1973. No início da década de 1960 foi responsável por inovações na organização da redação, posteriormente replicadas em outros veículos. Uma delas é a criação de editorias de acordo com temas. “Criamos uma editoria de economia, que até então não existia”, lembrou. Os jornais reproduziam o que recebiam das bolsas de Nova York, Chicago e Rio, o que chegava das bolsas de mercadorias. Quando havia uma decisão do governo, ia para a página de Brasília.

Dines também contribuiu para a criação de recursos de arquivamento e consulta. Segundo contou à revista da Fapesp, uma das primeiras editorias criadas foi a de pesquisa. “O jornal não arquivava sequer suas fotografias. Não tinha nem dicionários. Propus que criássemos uma biblioteca básica, com livros de referência, e que arquivássemos os negativos”, lembrou. “Fomos comprando livros, formando uma base de dados – não tinha internet –, tudo em pastas e criamos o departamento de pesquisa.”

Dines foi um incentivador do jornalismo sobre jornalismo. Inspirado em um mural interno do jornal The New York Times, em que as edições do jornal eram sujeitas a críticas e comentários, Dines idealizou os “Cadernos sobre jornalismo”. A publicação, que circulava internamente e para amigos e agências de propaganda, ficou sob os cuidados de Fernando Gabeira, então diretor do Departamento de Pesquisa do JB. Depois, passaria a ser vendida em bancas e livrarias. A tiragem chegou a mais de 3 mil exemplares.

Em 1975, já na Folha de S. Paulo, Dines começou a escrever a coluna “Jornal dos jornais”, com foco semelhante. “A intenção era justamente aproveitar a distensão política para começar a discutir a imprensa que, em alguns casos, estava ainda sob censura”, relatou em entrevista à revista Ide. A coluna durou até 1977.

Em 1996, Dines fundou o site Observatório da Imprensa, projeto originalmente concebido no Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo (Labjor) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). O site ganhou versões televisivas em diferentes épocas. A mais recente foi transmitida pela TV Brasil, entre 2007 e 2016.

Com publicações diárias, o site trazia uma coluna de Alberto Dines, além de colaboradores regulares e contribuições de jornalistas, acadêmicos e executivos da comunicação. Na ocasião dos 20 anos do site, em 2016, Dines escreveu que seu objetivo era ser uma “consciência crítica” da imprensa brasileira, comprometida com um jornalismo que fosse “o motor do processo civilizatório e não apenas um mero canteiro de tecnologias”.